No bicentenário da morte do Missionário Redentorista São Clemente Maria Hofbauer (1751-1820), vamos falar de sua pessoa e do trabalho pastoral desenvolvido por ele junto aos migrantes. Ao tratar deste santo nos situamos na transição
do século XVIII para o XIX: tempo do Iluminismo, do racionalismo, do desprezo
pelas artes liberais e literatura. O tempo de atrito entre Iluminismo e
Romantismo. O imperador José II queria o monopólio das Igrejas em seu
território, o pós-jansenismo ou josefinismo planejava uma catolicidade
manobrada pelo Estado austríaco. Este estava integrado à Polônia. Nesse período
o fluxo migratório se dava entre franceses, alemães, poloneses, russos e etc.
Clemente
fez parte desse universo e até chegou a assumir uma identidade missionária peregrina
em 1775 quando se tornou “eremita” em Mühlfrauen e Tivoli, perto de Roma[1]. “Clemente
Hofbauer foi toda a sua vida um incrível andarilho. Viajava o mais das vezes a
pé. O peregrinar também lhe estava no sangue. Sendo ainda aprendiz de padeiro,
tinha uns 18 anos, fez a primeira grande peregrinação a Roma”[2].
Esteve na Itália durante meio ano e depois se dirigiu para sua terra, a fim de
ser peregrino em sua pátria. Em dois espaços se situam a ação pastoral de
Clemente, relacionada com o migrante: Varsóvia (de 1787 a 1808) e Viena (de
1808 a 1820).
No
primeiro caso, em consequência das três divisões da Polônia (1772/1793/1795),
Varsóvia foi ocupada pelos russos, pelos prussianos e austríacos no reinado de
Estanislau II. Mortes, violência e atrocidades fizeram parte deste contexto.
Havia em Varsóvia uma instituição que alojava migrantes pobres, doentes, crianças órfãs e que fazia parte da confraria de São Bento. Clemente assumiu esta confraria. Para dar assistência aos abandonados
e migrantes criou a) a escola para crianças pobres, b) a escola de humanidades,
c) a escola industrial ou de trabalhos manuais e d) o orfanato e acompanhamento
(HEINMANN, 1988, p.63-69). A ação pastoral ética do amparo, da misericórdia, do resgate da pessoa e da dignidade humana
e do acompanhamento humanista configurou uma das principais preocupações de São
Clemente.
Viena
contrasta com as mudanças que aconteceram na Europa: a Revolução Francesa e as
guerras napoleônicas. “Nesse tempo, morava em Viena cerca de 250 mil pessoas de
diversas nações e, dessas, 50 mil dentro dos muros da cidade. A situação social
se configurava cada vez mais crítica” (SCHERMANN, 2007, p.117). A responsabilidade pastoral ética de São
Clemente estava na instrução do povo, o
cuidado com o pobre e a saúde pública. Em maio de 1890, Napoleão sitia a
cidade. O imperador francês selou uma paz humilhante com a Áustria, com o custo
de dezenas de milhares de feridos nos hospitais. A responsabilidade para com os
abandonados fizera Clemente passar significativa parte do seu tempo cuidando deles, dentre os quais estavam
os emigrantes regionais e os de fora. Aqui está retratada a compaixão samaritana para com os migrantes além dos nativos. A
benignidade pastoral fez Clemente praticar o cuidado espiritual das almas por meio da confissão, penitência,pregação,conselho,
benevolência etc. Assim se dei o testemunho pastoral, sacramental e social deste zeloso Redentorista. Que São Clemente nos inspire frente as realidades da migração na contemporaneidade.
Texto extraído do segundo capítulo da minha monografia "Traços éticos da Migração: das Sagradas Escrituras à Contemporaneidade". Tal monografia foi entregue no último semestre do curso de Teologia na Faculdade Jesuíta de Filosofia e Teologia, no ano de 2019.
[1] SCHERMANN, Hans (Org.). São Clemente Maria Hofbauer: perfil de
um Santo. Aparecida, SP: Editora Santuário, 2007, p.19.
[2] HEINZMANN, Josef. Vida de São Clemente Hofbauer: anunciando
novamente o Evangelho. Aparecida, SP: Editora Santuário, 1988, p.23.