O Natal do
Senhor, assim como a ressurreição de Jesus, é um dos momentos celebrativos mais
culminantes da Liturgia de Nossa Igreja. Na temática passada vimos alguns
elementos constitutivos e característicos do Natal de Jesus, que somos
convidados a celebrar, como a entrada de Jesus na história, a revelação de
Deus-menino, as esperanças trazidas por Jesus, a confirmação da Fé e o
testemunho vivo do cristo em nosso meio. Hoje vamos colocar em consideração
algumas coisas que dificultam a boa celebração do Natal, ou distanciam o homem
do verdadeiro sentido do Natal. Esses elementos negativos do Natal são
característicos do desenvolvimento radical e não desacerbado do homem na
história e de seu desvio da meta na qual ele é chamado a viver por Deus.
Assim, os
fatores negativos que promove ruídos
na vivência do Natal são de ordem econômica, política, espiritual e moral. São
eles : 1) o capitalismo radicalizado; 2) o sistema governamental laico; 3) a
alienação religiosa; 4) a crise moral; 5) e a cultura anti-cultura. Todos esses
pontos são observados e destacado pela falta de maturidade e a desvalorização
do que há de mais primitivo e essencial na natureza humana: a vida, a dignidade de humano e sua Fé
Cristológica.
1)
o capitalismo radicalizado: pólos opostos e
inpreparados para vinda de Jesus
A modernidade
trousse para o homem uma produção industrial muito valiosa. Com a bússola, os
livros, e a tecnologia primária o homem chegou a horizontes nunca antes visto.
A América é um exemplo disso. Assim a modernidade desenvolveu relações
comerciais e tecnológica, através da exploração das camadas sociais inferiores
e pobres (mulher, crianças, idosos, escravos) e produziu um bom aparato
comercial. O desenvolvimento na produção do mercado comercial, a instauração de
lucro (à custa do trabalho não-pago) promoveu o que chamamos de capitalismo.
Esse sistema
tendia a promover a evolução econômica de uma parcela da camada populacional. Aos
poucos a tecnologia foi tomando conta de nosso mundo. Os sistemas de escravidão
e exploração passou a chamar-se de emprego,
porém boa parcela da população tinha acesso a tecnologia. A televisão, o rádio,
dentre outros elementos constitutivos da explosão tecnológica, passou a fazer
parte de nossa vida. Evoluímos muito em questões econômicas e tecnológicas,
porém regredimos em questões humanas. O homem é observado como um meio
econômico, como uma peça (descartável) que tem a utilidade de promover capital
(lucro). O sentido do ser- humano aos
poucos foi se perdendo até a contemporaneidade.
É claro, algumas empresas promoveram assistência
psico-social para resgatar o valor do homem-pessoa, enquanto funcionário da
empresa, porém as relações de recursos humanos estão prioritariamente
trabalhando o homem e destacando suas potencialidades e importância em função
da promoção e desenvolvimento da empresa, e não do trabalhador. Sem termos
noção do que estava acontecendo, a humanidade absolveu esse sistema a tal ponto
de todas as suas relações sociais, amorosa, moral e política, estarem pautada
sob a economia. Pensamos e agimos de modo econômico. Os amigos que estão em ascensão
econômica, ou de cargo de trabalho, muitas vezes tem mais valor do que os
pobres, ou os que estão na última classe econômica. Enquanto muitos têm pouco,
poucos têm muito. Os interesses passaram a ser de bens de valor. A natureza é
explorada e poucas são as pessoas que tentam promover de fato um
desenvolvimento ecológico, mas isso não promove lucro, então pouco se faz,
apesar de muito se falar.
Nesse sistema
capitalista existe uma falha que está nos dois pólos de sua economia (a
escassez e a super abundância). Os dois extremos prejudicam de modo fortíssimo
a vivência do natal de Jesus. Em um Jesus e a esperança de Jesus se faz
necessária e urgente, em outro reclama por uma efetivação da vontade de Deus,
porém os dois pólos não estão preparados para o nascimento de Jesus, apesar de
se fazerem necessitantes. De modo simplista, em quanto na mesa do pobre, pouco tem para promover o encontro
fraterno entre famílias com o menino Jesus, com a promoção da esperança de vida
feliz plena (e neste local ocorre forte mente o grito do Cristo que é carente
de tudo), com a dignidade da pessoa humana, de seus valores enquanto cristão,
em outros lugares existe uma super-abundância de bens materiais, que denotam a
inutilidades de muitos objetos, de muitos bens para o verdadeiro valor do
Natal. Neste caso o espaço e a situação econômica, muito mais prejudicam a
identidade e unidade e encontro pleno com o Menino Jesus, que nasceu numa
estribaria (curral de cavalos) do que denota uma verdadeira celebração do
nascimento de Cristo-Menino. Neste sentido a crítica se dá pelo fato de
enquanto nos cantos escassos economicamente se situar uma injustiça, exploração
e déficit na disposição e valor do homem para se ter uma digna e verdadeira
celebração do nascimento das esperanças de felicidade plena do menino nazareno,
em outros locais muito se tem em bens, em objetos, em material, e muito se
perde no verdadeiro encontro de um Jesus desprendido de coisas passageiras.
Portanto, a disposição de celebração do Natal, e daquilo que tudo de fundamental
e necessário promove a vinda do menino Jesus, nesses dois espaços são pouco
aproveitadas, daí a necessidade de um profeta, do verdadeiro sentido do Natal.
2)
o sistema governamental laico
Com a
separação do estado com a Igreja suas relações passaram a ser de pura
diplomacia e seus objetivos distintos. Enquanto que na Igreja se fala de um
reino de paz, de amor, de partilha, de fraternidade e unidade como irmãos(
apesar de nela está inserida seu caráter de Igreja falha, pois movidas por mão
humanas); enquanto nossa Igreja se preocupa em ser um efetivo indicador de Jesus como nosso salvador, porta para o
encontro com Deus; enquanto ela promove ações sociais para manutenção da vida
de muitas pessoas carentes, e ao mesmo tempo mantém uma relação de compromisso
com suas instituições sociais, o estado, por sua vez, tenta promover a
manutenção sócio-política do povo. Assistências sociais como educação, moradia,
cidadania, distribuição de empregos, dentre outras coisas são atividades
promotora do estado. Essa cisão do setor antropológico do religioso limitou a
ação da Igreja, e por outro lado excluiu aos poucos o caráter religioso das
instituições seculares. Neste sentido a
difusão e promoção de outras morais, a preocupação do aspecto econômico em
primeiro plano e a gerencia de governo pautado por legislações hierárquicas, a
tal ponto de monopolizar a distribuição de renda e cargos vitalícios, são
contributos do estado. Assim, a regência do estado está promovendo outras
coisas de caráter ontológico, porém que pouco direciona o homem contemporâneo
para a sua essência. Enquanto natureza, o homem é essencialmente religioso, e
enquanto seguidor de Cristo, o homem é essencialmente Cristão. Neste sentido,
sua felicidade está não só no plano antropológico, mas faz parte de um
itinerário transcendente. Se o estado não é religioso, e nem tem a função de
promover aquilo que é essencialmente humano, então o natal do Senhor não está
dentro de sua preocupação de regência, muito menos no intento da promoção
religiosa. Neste sentido pouco se estimula uma disposição moral, política e
social na área parcial da natureza humana: sua religiosidade cristã. As lacunas
do estado, na tentativa de promover um desenvolvimento do homem em sua
totalidade, são inevitáveis!E a disposição para o verdadeiro encontro e
aderência as esperanças do menino Jesus pouco, pra não dizer nada, se realiza
pelo estado.
3)
a alienação religiosa
No aspecto
religioso estamos diante de alguns
problemas quanto a forma religioso- cristão de se obter uma maturidade de
fé, e uma espiritualidade clara e evidente que promova um efetivo e proveitoso
encontro natalino com Jesus. Durante a história de nossa Igreja tivemos
diversas camadas religiosas que promoveram diversas diretrizes acerca do modo
de se compreender e expressar a revelação divina no seu
aspecto mais original e fundamental. Várias foram às correntes que se
desenvolveram no interior de nossa Igreja, porém, na maioria das vezes muitas
delas entraram num radicalismo completo. Cito aqui duas correntes atuais que
ainda hoje tanto são extremistas como exploram aspectos diferenciais do mesmo
Jesus: A Teologia Libertária e a Renovação Carismática. Essas duas correntes
internas de nossa Igreja se identificaram com seu viés de experiência e
expressão de Deus, na sua linha particular religiosa de tal forma que, em
muitos casos, excluíam, ou não participavam de outros eventos ou movimentos que
não tivessem o seu caráter pessoal de identidade. Assim a Teologia da
Libertação fez uma escolha preferencial
pelos pobres de modo radical, que sua forma de anuncio de Jesus passava a
ser um Jesus que se identificava com os pobres e lutavam pelos mesmos. Em
muitos casos essa corrente não focava em outros fatores determinantes da
espiritualidade religiosa da Igreja como um todo. Muitas vezes se esqueciam que
os ricos também são chamados a participar do Reino de Deus. Em determinado
sentido, essa correte tinha uma espiritualidade promotora do seu espaço de
luta, delimitando a mensagem salvífica de Deus. Suas alas radicais mais se
inclinavam para uma exigência social e política, do que um momento de abertura
para o contato introspectivo com Deus. Na renovação Carismática o oposto se
fazia: a consciência crítica e de luta era pouco explanada, a expressão de fé
mais parecia uma espiritualidade limitada pela ação do Espírito Santo e o valor
da oração (destaco também um tipo diferencial de oração que valorizava mais uns
do que outros) era algo principal e primordial na vida do religioso. Esse
radicalismo espiritual deixava a desejar outros fatores essenciais humanos como
o valor da dignidade do homem enquanto homem-participante deste mundo e a luta
por uma vida digna em locais de extrema pobreza. A fé é o forte desta corrente,
porém o que não concorresse para essa identidade era visto de modo excluso por
esta corrente. Inclusive alguns aspectos que são essenciais da natureza humana.
Contudo, essas duas correntes, e existem muitas outras, mas destaco as mais
conhecidas, são formas extremistas de observar a face de Jesus. Neste sentido,
qualquer radicalismo tende a um erro, tanto no assertivo contato como o natal
de Jesus, quanto na promoção da boa nova de Jesus. Contudo, é relevante cita
outros movimentos que pouca postura clarificante tem diante do mistério
natalino. Algumas correntes ou movimentos religiosos se prendem as aparições divinas, o caso não é que são verdadeiras
ou não, reais ou falsas, mas pelo fato de ser o objeto determinante e exclusivo
da motivação e ação religiosa. Jesus fez milagres para cumprir o que estava
contido nas palavras dos profetas, mas o verdadeiro sentido da fé está na
tentativa de unidade com Deus e no valor da dignidade do homem enquanto
natureza conformada pelo menino
Jesus. Outro fator que mais torna confuso o entendimento e a aderência ao
projeto de Jesus instaurado pelo seu Natal é a mistura de religiões, o
sincretismo religioso é algo que contribui e atrapalha o verdadeiro sentido do
Natal de Jesus. Na verdade mais atrapalha que contribui. Em muitos momentos não
se sabe se Jesus é observado como o filho de Deus, como o salvador do mundo ou
como mais um deus de culto divino. Os elementos indicativos do Natal são
misturados a outros elementos a tal ponto de se perder o sentido essencial
natalino. A mistura do fato religioso das aparições como outros elementos
místicos pagão, ou cosmológicos, ou de cultura afro abrasileirada numa mistura
entre o consciente e inconsciente são fatores que mais complicam do que
esclarecem acerca do entendimento da espiritualidade natalina.
4)
a crise moral
Com a
transição da modernidade para os tempos atuais a globalização promoveu um
contato efetivo entre os diversos países.
A intercomunicação, a intercomercialização, dentre outros inter, foram as bases para tornar a
visão do mudo mais unitária e complexa. Antes a visão de mundo e sua disposição
moral estavam determinadas pelos limites territoriais de um povo. Nos países
circo-vizinhos da Itália, na modernidade a visão exata e objetiva do homem
passou a ser os elementos determinantes do comportamento humano. A visão
individual passou a entrar na noção de homem. Neste sentido, a moral se diferenciou
em sua definição pelo seu aspecto de extensão. Assim, a visão dos indivíduos
sobre si, os valores que ele mesmo se identifica são concebidos como fatores de
destaque do estudo da ética. Neste sentido a ética é os valores, hábitos,
costumes inseridos nos indivíduos que caracteriza sua personalidade. A ética
está no âmbito pessoal, pois não se determina em função da sociedade, mas do
ego humano. Já a moral fixou-se como aspectos de um povo, ou comunidade, aquilo
que define seu caráter de ser, aquilo que está contida nos seus valores que por
convenção se tornou universal.
Portanto, a moral está no âmbito de comportamento, de valos, de cultura de um
povo. A globalização tornou a relação intrínseca entre as diversas morais que
tanto o conflito, o choque, de morais como a mescla de suas diversidade moral
foi inevitável. O intercambio comercial, tornou-se um intercambio moral, daí o
conflito ocorreu. Conforme foi se
aprimorando o capitalismo as relações internacionais seguiram a mesma lógica. A
migração tornou outras morais próximas, o contato com culturas e valores
distintos e múltiplos tendenciaram ao que conhecemos como relativismo. Daí como se vê no Brasil, existe uma pluralidade de
morais que subsiste no nosso país. O cristianismo tem uma moral que foi embutida
no Brasil, antes do Brasil ser Brasil. Isso se deu pelos Portugueses (além dos
Franceses, Ingleses...) pelo encontro e invasão de novas terras: América. Com
eles inseriu-se o cristianismo aqui. As culturas, e religiões que tinham
passaram a ser ignoradas, se não massacradas, porém aqui ficou uma mescla de
elementos morais cristãos com outros. Digamos
que mesmo assim, a moral cristã era forte, portanto predominante. Com a
migração e o intercambio comercial, com a laicização do estado, o capitalismo e
a pluralidade de morais, que se formaram e se reformaram a moral cristã passou
a ser questionada e descartada ao plano de menor importância. O povo
essencialmente é cristão, ou tem valores que são da moral cristã, porém o
envolvimento e a relação com outros valores e morais diversas, fazem o sentido
do Cristianismo está perdendo sua força. O Brasil é um país festeiro, as
questões econômicas estão inserida no seu sistema de valores, os valores
antigos não se sustentam e tudo está entrando em crise e num relativismo. É
constante ouvirmos as pessoas dizerem: “os tempos agora estão diferentes! Diante
disso, a promoção da boa nova acaba seguindo o mesmo caminho, quer queiramos
quer não. Uma norma, ou regência de governo permanece quanto todos, ou pelo
menos a maioria, a aceitam e a mantém. Porém, como o conflito de morais, com as
crises, a sustentação se torna sofrível. Daí, muitas vezes se insere uma moral
fantasma: só se fala que se deve ser assim, se deve agir assim, mas que na verdade
poucos fazem. Esses fatores são imprescindíveis para o entendimento de como se
está celebrando o natal do Senhor. Pois como a variação de valores, com as
crises morais, o ambiente pouco está preparado, apesar de muito necessitado,
para a inserção da esperança que renasce. Vale salientar que o natal é
celebrado, porém que neste sistema que estamos é pouco vivido e continuado.
5)
a cultura anti-cultural-religiosa
Atualmente, querendo
ou não, a cultura brasileira interfere de certo modo no verdadeiro sentido e valor
do Natal do Senhor. Com o desenvolvimento tecnológico, as culturas tornaram-se institucionais.
O valor humanitário, o espírito de unidade e fraternidade que se tinham nas
culturas foram ficando para trás. A técnica entrou no espaço cultural e
artificializou inclusive nossas relações. Antes havia uma convenção e relação
da cultura, do valor humano com a religião Cristã. Os dias festivos estavam
unidos aos dias religiosos. Muito de respeito se tinha pelo valor da moral e
cultura que se promovia na sociedade. O valor humano e aquilo que compete aos
homens e mulheres, enquanto cristão, era prioridade. As músicas, as festas, a
culinária, a estrutura social tinha um modo muito expressivo do humano e da
valorização do indivíduo. Porém, com a inserção de novos valores, novos hábitos
foram sendo cultivados, e outros perdidos. As estruturas econômicas passaram a
ser de estrema importância e o valor do capital passou a cercar toda
criatividade humana e toda estrutura comportamental humana. As culturas estão
sendo deturpadas por valores que não engrandecem e nem dignificam o valor do
homem e da mulher. A cultura que elevava o valor religioso e destacava a importância
de Jesus no Natal, cada vez mais se distanciam desse propósito. Daí, o que não
tem nada de belo, entra no currículo cultural humano, e o verdadeiro sentido de
unidade, fraternidade, paz, amor, família, estão sendo ignorados e colocados no
último plano, ou a serviço do movimento de uma economia. O artificialismo é
inevitável e as relações humanas ficam cada vez mais desgastadas.
Distanciando-se do verdadeiro sentido do Natal: unidade, fraternidade,
dignidade, amor, paz...
Contudo, os
pontos em questão tentam esclarecer acerca dos impasses que temos na atualidade,
que nos distanciam cada vez mais do mistério natalino. A unidade com Jesus nos
coloca diante de uma busca por tudo aquilo que ele promove, pelo seu reino que
inicia-se em nosso meio, a partir do nosso mundo, quero dizer, de nossa compreensão
de mundo. Precisamos estar atentos para não jogar fora a promoção da vida e da
felicidade que está inserida na boa nova de Jesus e que sintamo-nos responsáveis
e contentes por levar o projeto de Jesus aonde ainda não foi instaurado. Feliz
Natal para todos!
Isaias Mendes,
Postulante Redentorista.