sábado, 27 de outubro de 2018

Sustentabilidade: uma definição integradora para a Ecoteologia.


Isaias Mendes Barbosa, CSsR.
A Ecoteologia trata da inter-relação, interdependência, ou comunhão integral entre todos os seres – bióticos e abióticos – quem fazem parte do nosso planeta. Ela se situa no âmbito científico, ético, antropológico e ambiental, porém, inspirada na e a partir da fé cristã, sabedoria bíblico-religiosa, da Tradição e Doutrina eclesial.
Todavia, Sustentabilidade se classifica como outro termo (substantivado ou adjetivado) relevante para Ecoteologia no âmbito ético, político e ecológico, na relação transitiva e dialogal dentre a fé cristã, a comunidade de vida e humana que permeia o nosso ecossistema planetário. Ora, os governantes, as empresas e os meios de comunicação midiáticos não poucas vezes se apropriam de tal termo nas propagandas de marketing, sem saber ou desvirtuando o real e profundo significado de Sustentabilidade (BOFF, 2012, p.9).
O problema não está somente numa definição conceitual inapropriada, mas também na forma como ela é utilizada para iludir, inebriar o público alvo (a população), a fim de que este continue a consumir produtos ou apõe projetos que pouco ou nada têm haver com a Sustentabilidade no sentido original e essencial do termo.
Diante do falacioso uso do termo, da incoerência conceitual e prática dos modelos atuais de economia e política socioambiental, pretendemos apresentar onde está o problema sobre tais modelos – até então definidos como sustentáveis – e sobre os problemas de sua prática social na contemporaneidade. Por conseguinte, esboçamos uma definição integradora do referido termo em relação com as diversas dimensões da esfera humana e da comunidade de vida, assim como destacamos suscintamente a relevância dessas colocações para a Ecoteologia.
O Teólogo Leonardo Boff na obra “Sustentabilidade: O que é. O que não é” analisa criticamente os seis modelos atuais de Sustentabilidade utilizados pelos governos e empresários. O primeiro modelo (padrão de desenvolvimento sustentável) classificou-se como capitalista, industrial, mercantil exploratório. Os efeitos de tal modelo na política e prática empresarial foi a exploração da Terra, a produção de desigualdade humana, a pobreza e a miséria. O consumo e exploração constante dos bens naturais, que eram limitados, geraram a degradação ambiental e o desrespeito ao ritmo de desenvolvimento da natureza. O desenvolvimento sustentável viável, justo e ambientalmente correto não aconteceu, portanto, se classificou insustentável (BOFF, 2012, p.41-44).
O segundo modelo (neocapitalista) aceitou as regulações do Estado, mas deixou o Mercado livre para seguir sua lógica concorrencial. Isso gerou tensão e desequilíbrio na sociedade estadunidense. Daí continuou-se a extração dos insumos da natureza e criou-se uma perversa desigualdade social (BOFF, 2012, p.51-52). O terceiro modelo (do capital natural), contraditório no uso do termo, pretendeu incorporar ao processo econômico os fluxos biológicos. A finalidade era potencializar a natureza, por diversos meios técnicos, químicos e naturais, para que ela produzisse mais. Tais ações geraram reposição de recursos naturais, mas para fins econômicos em detrimento da dignidade, valor e ritmo que a natureza possuia em si mesma (BOFF, 2012, p.52-52).
O quarto modelo (de economia verde) que integra ecologia e economia de forma harmoniosa, pretendeu auxiliar os pobres e pequenos agricultores com os meios técnicos, sementes e créditos. Tentou-se uma redução da poluição ambiental por diversos meios. Porém, a mudança prevista não alterou os padrões de consumo e nem esclareceu sobre os meios (éticos ou não) para a produção “verde” e os efeitos agressivos ambientais de tais atividades. Nesse modelo a desigualdade não foi minimizada pela sua raiz social e cultural (BOFF, 2012, p.53-55).
O quinto modelo (ecossocialismo), ainda não concretizado, visou uma produção respeitosa da dinâmica da natureza e promoveu a economia humanitária fundada nos direitos e nos princípios éticos fundamentais humanos. Mas tal proposta está encerrada no antigo paradigma não relacional entre o humano, a terra e o universo (BOFF, 2012, p.56-57), tal modelo teve as limitações do fechamento da sustentabilidade exclusivamente antropológica. O sexto modelo (do ecodesenvolvimento ou da bioeconomia) subdividido em três expressões trata a) do decrescimento econômico; b) combina economia, ecologia, democracia, justiça, inclusão e equidade social; c) e busca uma democracia econômica na qual o crescimento deveria ser sustentável, suficiente, eficiente e equânime. Porém, tal modelo até agora não apresentou a força argumentativa da nova cosmologia e da ecologia da transformação (BOFF, 2012, p.60-61).
Em síntese Boff apresenta a razão ética de sua critica aos modelos políticos e empresariais de sustentabilidade:
Em conclusão podemos dizer: pouco importa a concepção que tivemos de sustentabilidade, a ideia motora é esta: não é correto, não é justo nem ético que, ao buscarmos os meios para a nossa subsistência, dilapidemos a natureza, destruamos biomas, envenenemos os solos, contaminemos as aguas, poluamos os ares e destruamos o sutil equilíbrio do Sistema Terra e do Sistema Vida. (BOFF, 2012, p.64)
            Se tais modelos apresentados demostram uma errada compreensão ou ilusória ideia sobre o termo Sustentabilidade, isso se dá por diversos motivos dentre os quais se destaca o sistema econômico, técnico e político vigente que se motiva a busca livre e irrefreável do capital acima de tudo e de todos, assim como tais lideranças políticas, empresariais e governamentais criam projetos, partem de “ideologias” ou pressupostos que pouco ou quase nada tem haver com o significado mais substantivo de Sustentabilidade e das dimensões que tal termo engloba ao pensamos no Bem Comum.
Neste sentido a compreensão e práxis do dito termo não alcançaram sua extensão e definição conceitual indicada por Boff: sustentar, segurar por baixo, suportar, servir de ancora, impedir que caia, impedir a ruína e a queda. Para Boff a compreensão prévia para uma definição original e eticamente necessária de Sustentabilidade se refere a tudo o que fizermos para que um ecossistema e a sua biodiversidade não decaia e se arruíne. Neste sentido se enfatiza o acréscimo de termos ou sentidos que fazem parte do mesmo campo semântico de Sustentabilidade: o conservar, o manter, o proteger, o nutrir, o alimentar, o fazer prosperar, o subsistir, o viver, o conservar-se sempre à mesma altura e conservar-se sempre bem (BOFF, 2012, p.31). “Estes sentidos são visados quando falamos hoje em dia de sustentabilidade, seja no universo, da Terra, dos ecossistemas e também de inteiras comunidades e sociedades: que continuem vivas e se conservem bem” (BOFF, 2012, p.32).
A partir da constatação do que não se denominou como sustentável nos projetos e ações governamentais e empresariais, vamos em busca de uma definição mais clarificada de tal termo. Ela deve abranger as relações entre os diversos setores de intervenção humana no sentido positivo do termo, assim com deve se relacionar com os âmbitos observados na Ecoteologia: cosmologia, antropologia, ética, ecologia. Neste sentido Boff nos atenta para alguns elementos presentes na história recente do conceito de Sustentabilidade. Ele sustenta que a preocupação do termo partiu da silvicultura, com o manejo das florestas, mas se originou conceitualmente na Alemanha. Se no início a questão estava relacionada com a preservação da floresta, pela limitação de corte para o consumo humano e produção de carvão mineral (BOFF, 2012, p.34-35), ao longo do tempo outras questões forma somando-se e se relacionando ao termo.
A preocupação de manutenção dos bens naturais para as futuras gerações, a limitação ou refreamento do crescimento económico, a radicação da pobreza, dos padrões desiguais de vida, a saúde do sistema ambiental, a reciclagem dos resíduos naturais, a busca por energia renovável (alternativa), a conservação da biodiversidade e a interdependências entre todos os seres, foram elementos ou questões que ampliaram e somaram-se na definição de Sustentabilidade e na busca de efetivação do termo nos programas de diversos países para a manutenção, o desenvolvimento e bem estar equitativo da vida humana e planetária.
Dois pressupostos são fundamentais para uma definição integradora de Sustentabilidade, a saber: o cosmológico e o antropológico.  O primeiro se reporta a “visão geral do universo, da Terra, da vida e do ser humano que serve de orientação para as pessoas e para a sociedade” (BOFF, 2012, p.77). Essa visão engloba a cosmogênese, o processo evolutivo e interdependente de todos os seres. Trata-se de um sistema aberto e em processo de transformação, harmonia, adaptação e etc. O universo é visto como um todo, a massa e a matéria são equivalentes, e na matéria está a informação como o resultado da interação entre todos os seres.
O segundo pressuposto, não sem relação com o primeiro, apresenta a gênese humana. O processo evolutivo complexo – de interiorização e interdependência – se transformou e nele surgiu à complexidade mais sofisticada da vida, a vida humana. Da interioridade surge o sistema nervoso central e um cérebro humano. Aqui desponta a consciência, a inteligência, a espontaneidade e a liberdade; a espiritualidade, a cordialidade, o cuidado e a vulnerabilidade (BOFF, 2012, p.82-83). Antropologia e cosmologia se integram e se relacionam como pressuposto da Sustentabilidade. Daí Boff apresenta uma definição integradora:
Sustentabilidade é toda ação destinada a manter as condições energéticas, informacionais, físico-químicas que sustentam todos os seres, especialmente a Terra viva, a comunidade de vida e a vida humana, visando sua continuidade e ainda atender as necessidades da geração presente e das futuras, de tal forma que o capital natural seja mantido e enriquecido em sua capacidade de regeneração, reprodução e coevolução. (BOFF, 2012, p.107)
As condições favoráveis da existência de todos os seres é a base que dar sentido ao emprego do termo. Desde o processo da cosmogênese e da biogênese que se observa o processo evolutivo e transformador dos seres pela conjugação de elementos energéticos, informacionais e físico-químicos. É o fundamento de tudo e passo inicial para que os diversos seres que compõe a comunidade de vida e vida humana subsistam e se conservem enquanto tal (BOFF, 2012, p. 107).
A sustentação vital de todos os seres supera o paradigma antropocêntrico moderno (estrito) que exerce a objetivação ou coisificação instrumental da comunidade de vida planetária e cósmica. Isso significa que independente da funcionalidade utilitarista e capitalista, a biodiversidade, todos os seres bióticos e abióticos que participam do nosso habitat são importantes para a Sustentabilidade.
Por outro lado, a Terra é mais do que um instrumento de extração e captação de bens, é uma célula viva que se autorregula, sofre, regenera-se, evolui. É a base de subsistências da comunidade de vida e vida humana. Da Mãe Terra sai todas as demais formas de vida e conservação dos seres. O meio ambiente é espaço basilar da nossa existência. Somos interdependentes. Sem essa cadeia ou rede de vida a existência fica fadada ao fracasso (BOFF, 2012, p.108). A comunidade de vida forma os biomas e a biodiversidade para a continuidade da vida no planeta.
Neste o ser humano habita e participa da rede de vida e se destaca por ser o ser mais complexo e portador de consciência, sensibilidade, inteligência, amor e cuidado para garantir a continuidade da vida e civilidade humana, além de possuir a liberdade de intervir positivamente ou destrutivamente na natureza, no ecossistema e na espécie humana. A continuidade se dá pela fonte originária de todo ser e pelo processo de autocriação e expansão do universo vital. A assistência das necessidades humanas faz parte desse processo de Sustentabilidade da vida em todas as suas formas, pois são os recursos emergenciais que o Cosmo e a Terra nos oferece (BOFF, 2012, 109).
A conservação da nova geração além das que continuarão a nossa é condicionada pela relação de sinergia e cooperação com a terra e distribuição equitativa dos bens e serviços. A solidariedade e o direito de condições favoráveis de existência são os percursos de preservação das novas gerações. A comunidade de vida, por sua vez, é recoberta na Sustentabilidade como espaço para a vida e convivência do ser humano. Porém, não se tem cuidado, subsistência e conservação sem a capacidade de conservar o capital natural para ser entregue as gerações futuras (BOFF, 2012, p.109).
Ora, até aqui constatamos que a Sustentabilidade é de grande contributo para a Ecoteologia porque amplia e relaciona de modo profundo e integral a dimensão antropológica e a cosmológica. Neste sentido, há uma interdependência, ligação, relação, interação entre os diversos temas ou questões tratadas na Ecoteologia. O vínculo dos seres humanos com os demais seres que compõem a nossa Casa Comum e a visão planetária como um sistema complexo, inter-relacional e em constante auto-criatividade, transformação e evolução.
As questões da degradação humana e do meio ambiente tem o respaldo da Ética Humana Ambiental, do cuidado humano com a Casa Comum e da ligação dos seres humanos com os demais seres que compõe no nosso sistema planetário. Isso tanto é observado na Ecoteologia como na compreensão integrante da Sustentabilidade. Todavia, assim como na Ecoteologia, aquela se dedica a resgada o valor de todos os seres, independente de utilidade comercial e capital.
Ao ser tratado como pertencente às diversas esferas da vida humana e existência planetária, a Sustentabilidade se relaciona com as questões da pobreza, da desigualdade, da exploração comercial e capital, da degradação ambiental, da destruição do nosso ecossistema planetário e do próprio gênero humano. Neste sentido há uma aproximação muito grande entre Sustentabilidade e Ecoteologia. Pois tais questões se cruzam e se complementam na hora de se observar a vida nas suas variações de formas pelo princípio holístico. O respaldo que aquela dá sobre as questões da ecologia, da cosmogêneses, da antropologia humana, da economia, é enriquecedor na Ecoteologia, pois amplia as pesquisas e formas de pensar relacional e interdependentemente.
O processo sustentável desenvolvimento concede uma maior explicação sobre a evolução de todos os seres, isso serve como complemento para a dimensão teologal do dia da criação e da doutrina social da Igreja. Por fim, as questões éticas pertinentes a continuidade da geração presente e futura contribui na Ecoteologia para uma visão mais histórico-social-imanente da escatologia.   

Ecoteologia: o que é, que método usa e que temas trabalha?

Isaias Mendes Barbosa, CSsR.
            Ao falarmos de teologia estamos tratando de um tipo de conhecimento ou saber que deriva da fé cristã, mas se distingue desta porque apresenta formas, linguagens e métodos próprios, mais articulados e elaborados para descrever a vida, a compreensão e a forma de práxis do ser cristão. Sobre essa distinção entre fé cristã e teologia, Murad (2016, p.207) nos ajuda a compreender que a fé, é intuitiva, sensitiva, comparativa, expressa por analogias e aproximações das situações do cotidiano. Não elaborada categoricamente, a fé cristã faz parte da vida simples ou do sentido comum dos crentes, é um dom divino.
Já a teologia é discursiva, racional, ela elabora os dados da fé, das sagradas escrituras e da tradição eclesial, em busca de maior clareza sobre a vida e missão do cristão. É uma ciência com um rigor reflexivo, pois dá razão àquilo que cremos (fé), esperamos (esperança) e praticamos (caridade). A teologia está voltada para a luz da fé revelada para compreender o mundo, a vontade de Deus e responder evangelicamente às exigências da realidade. Apesar desta distinção, tanto a fé cristã como a teologia se implicam, pois a teologia é a reflexão sobre a fé cristã ou a partir dela. Elas partem de objetos indispensáveis ao saber e vida cristã: Deus, a Revelação e autocomunicação de Deus na história, e relação de Deus com a Comunidade (humana) crente e a realidade vivenciada. Todavia fica a questão: o que é Ecoteologia? Qual sua relação com a teologia e a fé cristã? O que diferencia a Ecoteologia dessas duas formas de saber?
A Ecoteologia é uma saber ou ciência que deriva da teologia, é parte desta. É um tipo de teologia cristã que partilha de elementos constitutivos da ciência da fé, porém com um diferencial, dentre outros: “consiste em pensar a fé no horizonte da consciência planetária. Essa se caracteriza como a (re)descoberta de que o mundo torna-se um todo, o ser humano è membro da Terra e deve assumir a responsabilidade pelo futuro do planeta habitável” (MURAD, 2016, p.211).
A Ecoteologia trata de questões que relaciona a humanidade com a sua práxis e a realidade planetária que a cerca. É um saber de relação, de interconectividade, de intercambio e interdependência com tudo e em momentos variados. Assim, três âmbitos fazem parte das questões inter-relacionais da Ecoteologia: a ciência da interdependência do todos os seres, a ética do cuidado com o planeta e o paradigma pós-antropocêntrico (MURAD, 2016, p.212). Ela amplia a visão e consciência humana para além de um antropocentrismo, ou visão tradicional antropológica. Situa o ser humano na relação com os outros seres abióticos (solo, ar, energia solar) e bióticos (micro-organismos, plantas e animais) da nossa esfera planetária.
Apesar da Ecoteologia tratar de questões ou temas que pertencem à teologia como a fé, a revelação, o homem, a ética, os escritos bíblicos, a tradição, a experiência religiosa cristã, ela tem uma singularidade quanto ao método, a linguagem e ao conteúdo. Há um rompimento da separação tradicional entre corpo e alma, sujeito e objeto, realidade humana e realidade da natureza, é um saber que promove a integralidade nas relações entre os seres que compõe o nosso ecossistema. Não há uma redução metodológica conceitual como na teologia tradicional, mas também uma combinação de símbolos e imagens para tratar das questões ou realidade teológica.
Ela combina elementos que aparentemente não possuem nenhuma relação entre si, como a sabedoria da terra e a sabedoria humana, a degradação ambiental e a mobilidade humana, o aquecimento global e a economia, o bem estar humano e o cuidado com o planeta, revelação divina e o nosso ecossistema, a crise ambiental e a fragilidade do pobre. O método “combina vários acessos à comunhão da criação: tradição, experiência, ciência, sabedoria, dedução, intuição” (MURAD, 2016, p.216).
Se a teologia é uma prática teórica que considera o saber hermenêutico pré-teológico – como a filosofia, a literatura, a arqueologia, a medicina e a sociologia – para aprimorar ou amadurecer sua compreensão e posicionamento ético (não fundamentalista ou dogmático) sobre a realidade, a Ecoteologia, por sua vez, serve-se de outros saberes ou ciências (sociais e ambientais) – como a história, a economia, a agroecologia, o ecodesign, a engenharia civil e arquitetura sustentável, a geografia, a ecologia e o estudo dos solos, dentre outros – para sua postura moral ecológica cristã fundamental sobre a realidade relacional humana e ambiental integral. Para além de um discurso eclesial ou magisterial, da tradição bíblica ou das verdades reveladas da fé cristã, a Ecoteologia pensa a realidade humana, ambiental, planetária, social, estrutural, cultural e política á luz da fé. Ela tem uma função crítica, construtiva e se insere no movimento de continuidade, rupturas e avanços da teologia contemporânea:
[...] Não alimenta a ilusão de ser a grande chave hermenêutica para reconfigurar toda teologia. Tampouco é um pequeno setor, que se ocupa somente de questões ambientais ou da teologia da criação. Consiste em uma perspectiva, um enfoque, que permite reorganizar dados da fé, inferir, dialogar e aprofundar. Ela influencia a produção da teologia ao colocar perguntas decisivas no momento de realizar o intellectus fidei, a mediação hermenêutica própria ente teológica, que utiliza a Bíblia e a Tradição eclesial, sensível aos “Sinais dos Tempos” (MURAD, 2016, p.222).
            A Ecoteologia pode tratar dos mesmos temas, elementos ou referencial teórico da teologia. Todavia, o seu diferencial está em contribuir ou ampliar o patrimônio vivo do saber teológico contemporâneo e poder avançar nas reflexões em diferentes áreas disciplinares até então pouco ou quase nada exploradas. Para exemplifica, sustentamos que a Ecoteologia ora trabalha, ora recebe contribuição teológica sobre diversos temas.
O tema da Terra é focado numa visão cristã sobre o ser humano em relação com a natureza e Deus. Aqui o princípio cosmogênico de complexificação, interiorização/diferenciação e inter-relacionalidade se constitui como fundamental; o tema antropológico da Graça apresenta uma perspectiva cristã antropológica em relação com o processo evolutivo da matéria e história do cosmos. Há uma reflexão sobre a graça original e o pecado no horizonte evolutivo; observamos o tema do mistério de Deus sobre a relação una e trinitária de Deus conosco. Essa comunhão fundamenta a biodiversidade e a diversidade humana, a prioridade da cooperação e interdependência de todos os seres;
A Cristologia acentua o Cristo glorificado, aquele que é Palavra criadora, primogênito de toda criatura, o Cristo cósmico; na Pneumatologia a Ecoteologia acentua a função do Espírito Santo que cria, conserva, renova e consuma o projeto de Deus, atuando no crente, na Igreja e no universo; a Ética tem como conteúdo a conservação e continuidade da vida em toda sua extensão, a Ética do cuidado; a Teologia bíblica trás para a Ecoteologia a questão da criação e salvação, louvor, compromisso histórico, a sabedoria, a ética, o profetismo e etc, numa unidade integral; o tema dos estudos patrísticos resgata as intuições dos primeiros séculos referentes à ecologia e a relação do pecado, encarnação e redenção de Cristo na natureza. Por fim acentuamos:
[...], a ecoteologia trata de temas explicitamente ecológicos, em âmbito prático, para ajudar os cristãos a constituir uma sociedade sustentável, viável. Por isso, assuntos como água, resíduos sólidos, política energética, biodiversidade, governança global, consumismo e consumo responsável, mobilidade urbana, uso do solo, qualidade do ar torna-se também matéria-prima para a ciência da fé, como ética teológica. Em dialogo com as ciências ambientais, compreende-se cada questão no contexto da biosfera. A pontam-se as causas diversas que levam a degradação do meio ambiente e do ser humano. (MURAD, 2016, p. 229)