Se crês, meu
irmão, que hás de morrer, que existe eternidade, que se morre só uma vez, e
que, dado este passo em falso, o erro é irreparável para sempre e sem esperança
de remédio: por que não te decides, desde o momento em que isto lês, a praticar
quanto puderes para te assegurar uma boa morte? Apressa-te em tomar o remédio
oportuno; decide entregar-te inteiramente a Deus, e começa, desde já, uma vida
que não te aflija, mas que te proporcione consolo na hora da morte. (LIGÓRIO,
Santo Afonso Maria de. Tempo
e eternidade: vida-morte-futuro, 2002, p.14-15)
Tal
frase da obra Tempo e eternidade:
vida-morte-futuro de nosso pai Santo Afonso Maria de Ligório apresenta uma
luz sobre o dia atual, em que fazemos memória ao dia dos falecidos e podemos refletir sobre nossa estadia aqui na terra. Por isso
vamos ver um pouco sobre essa bela obra.
O
tema geral de que ela trata é a vida,
morte e eternidade. A obra é composta por 20 capítulos seguidos de uma
oração. São reflexões e meditações que envolvem o tema geral. A obra é composta
por várias citações das Sagradas Escrituras, dos diversos santos ou sábios da
tradição cristã que auxiliam de modo pedagógico, numa compreensão sobre nosso
modo de vida e proceder para a nossa salvação.
A
nossa vida, dom gratuito de Deus, pressupõe algo que é inevitável para todos
nós: a certeza da morte. Todas as coisas passam, porém só a morte é certa. E a
grande diferença está no modo como a vemos e nos deparamos com ela. Para nós
cristãos a morte é passagem para a eternidade que pode seguir dois caminhos: o
caminho da glória em Deus ou do tormento eterno. Diante disso, muitos se afligem
quando a morte se aproxima. E a causa disso está no proceder humano aqui
na terra, apegado aos bens passageiros, ou no desacordo de sua vontade com a
vontade de Deus.
Nossos
santos viram a morte de modo diferente, ou seja, como a porta da vida na
presença de Deus. Segundo Santo Afonso:
os tormentos que afligem os pecadores na hora da morte não afligem os
Santos. “As almas dos justos estão nas mãos de Deus, e não os atingirá o
tormento da morte” (Sb 3, 1)(...) Não se afligem os Santos por terem de deixar
honras mundanas, pois sempre as desprezaram e as tiveram na conta do que são
efetivamente: fumo e vaidade, e somente estimaram a honra de amar a Deus e de
ser por ele amados. Não se afligem por terem de deixar seus parentes, porque
somente os amaram em Deus e, ao morrer, os deixaram recomendados àquele Pai
celestial que os ama mais do que eles; e esperando salvar-se, crêem que melhor
lhes poderão ajudar lá no céu do que ficando na terra. (LIGÓRIO, 2002, p.22) .
Os homens bons nada têm a temer na
hora da morte, sendo que Deus tendo as almas dos justos em suas mãos, assegura-nos
sua glória com Ele eternamente. Assim, na hora da morte, da tentação, do
desespero,
virão os santos protetores; virá São Miguel, destinado por Deus para a
defesa dos servos fiéis, no combate derradeiro; virá a Virgem Santíssima e,
acolhendo sob o seu manto que foi seu devoto, derrotará os inimigos; virá Jesus
Cristo mesmo a livras das tentações essa ovelha inocente ou penitente, cuja
salvação lhe custou a vida. (LIGÓRIO, 2002, p.27)
Aqueles
que amam a Deus e oferecem a sua vida, tornar-se-ão semelhante aos Santos e
Mártires. Portanto, Amemo-lo, pois, o mais que pudermos nesta vida, que só para
este fim deve servir-nos, isto é, para crescer no amor divino. O grau de amor
que tivermos na hora da morte será igual ao desejo que nutrimos em nos unir a
Deus na bem-aventurança eterna.
Assim,
a preparação para uma boa morte se faz necessária e isto esta durante o tempo
de nossa vida. Nosso Santo nos indica fazer esse percurso:
prostra-te aos pés do Crucifixo; agradece-lhe o tempo que sua
misericórdia te concede para regular tua consciência, e passa em revista a
seguir todas as desordens de tua vida passada, especialmente as de tua
mocidade. (...) Afasta de teu coração todo afeto mau e todo rancor ou ódio.
Satisfaze qualquer motivo de escrúpulo acerca dos bens alheios, da reputação
lesada, de escândalos dados, e propõe firmemente fugir de todas as ocasiões em
que possas perder Deus. Pensa que aquilo que parece difícil, impossível, te
parecerá no momento da morte. (LIGÓRIO, 2002, p.39).
Afonso
nos indica a aproveitar bem o tempo que temos para ganhar os bens eternos, que
fazem parte da Graça de Deus e de uma vida virtuosa. Esses bens não passam e
não se acabam como os bens materiais, mas perduram para eternidade. Eles sãos as únicas coisas que levamos nessa vida para eternidade. Se agirmos
assim, na hora da morte, teremos a nossa recompensa e estaremos em paz.
A
nossa salvação é a nossa meta que começa aqui e termina no Céu, porém é dela
que boa parte dos cristãos mais se esquecem. Sendo assim,
boa parte dos cristãos vivem como se a morte, o juízo, o inferno, a glória e a
eternidade não fossem verdades de fé, mas apenas fábulas inventadas pelos
poetas. Portanto, façamos todo esforço para adquirir o grande tesouro do amor
divino.
O pecado nos fasta de Deus e nos torna confusos e inquietos, sem paz. Segundo
Santo Afonso o pecado também ofende a Deus, pois o movimento que vai contra sua
vontade se dá contra o seu projeto de salvação que constitui parte de Deus. Porém,
apesar de nossos pecados, Deus na sua misericórdia infinita espera por nós, na
nossa humildade para pedi-lhe perdão, pois nos ama infinitamente e quer nos dar
aquilo que brota de dentro de sua divindade: o amor e a vida. Assim
como na parábola do filho pródigo.
Sua graça nos acompanha na medida em que nos
unimos a Ele e procuramos fazer a sua vontade, conformando a nossa com a Dele.
Pela oração alimentamos nossa fé e nossa alma, e nos disponibilizamos para a
comunicação e seguimento de Deus. A perseverança é outro elemento que nos ajudar
na caminhada, pois assim não nos perdemos diante das tentações, das inúmeras
opções vazias de sentido e verdeira felicidade.
O
pedido a Nossa senhora é outro elementos importante que Afonso cita como caminho
para vida segura e cheia de graça, pois, assim como Maria intercedeu aos povo nas
bodas de Caná, do mesmo modo ela faz por nós que somos seus filhos. Por fim, o
amor de Deus mais se revela e mais se aproxima na medida em que nos confiamos a
ele e nos entregamos para fazer a sua vontade, pois a nossa salvação está no
conformar da nossa vontade com a de Deus, uma vez que Deus já nos ama e deseja
profundamente nos salvar, porém, Ele não transgride nossa liberdade.
Entregemos-nos, portanto, sem reserva às mãos de Deus, que jamais deixa
de atender ao nosso bem (1Pd 5,7). “Pensa tu em mim,-dizia o Senhor a Santa
Catarina de Sena- que eu pensarei em ti”. Quem procede assim passará uma vida
feliz e terá morte santa. Aquele que morre inteiramente resignado com a vontade
divina deixa-nos a certeza moral da sua salvação. (LIGÓRIO, 2002, p.139) .
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