sexta-feira, 29 de julho de 2016

O Ano da Misericórdia e a Glória de Maria: o mesmo Espírito atuando no agora da vida (Revista Diálogo).


(Revista Diálogo: Revista de Formação e Informação da Província Redentorista de São Paulo, p.10-13)
Isaias Mendes Barbosa[1]
A abertura do Ano Santo da Misericórdia, com a Bula de proclamação do Jubileu Extraordinária da Misericórdia intitulada Misericordiae Vultu (FRANCISCO, 2015), ou seja, o rosto da misericórdia, trousse para os Cristãos Católicos e crentes de outras denominações religiosas afins, um tempo de graça, esperança e renovação. Tempo de aprofundamento, contemplação, esclarecimento e práxis evangélica. Essa foi, e está sendo, a proposta inspiradora, realizada pelo Papa Francisco em um dia mais que especial: o dia da Imaculada Conceição.
A abertura da Porta Santa e principalmente da porta do coração humano, na experiência da misericórdia de Deus, deve nos impulsionar para uma entrega e doação de si, em vista da salvação humana e do bem comum. Os sinais de tal comunhão espiritual são o dinamismo pastoral e missionário, o acolhimento humano, o diálogo intra e extra-eclésia, e a compaixão para com nossos semelhantes (crentes e não crentes). Essa proposta pela experiência redentora de fé, pelo imperativo criador e misericordioso divino, é urgente nos tempos atuais. Deste modo, há dois pontos que podem orientar-nos na nossa dinâmica existencial, missionária e pastoral: a Misericórdia divina trinitária e a figura de Maria na colaboração do processo de dignidade e salvação integral humana.
A temática central da Bula é a Misericórdia. Nela o Papa nos convida a fixarmos “o nosso olhar na misericórdia, para nos tornarmos nós mesmos sinal eficaz do agir do Pai”(Ibidem, p.4). Uma das expressões significativas deste ano jubilar é a compreensão da Misericórdia na Santíssima Trindade e como ela se desvela no projeto da redenção humana.
Misericórdia: é a palavra que revela o mistério da Santíssima Trindade. Misericórdia: é o ato último e supremo pelo qual Deus vem ao nosso encontro. Misericórdia: é a lei fundamental que mora no coração de cada pessoa, quando vê com olhos sinceros o irmão que encontra no caminho da vida. Misericórdia: é o caminho que une Deus e o homem, porque nos abre o coração à esperança de sermos amados para sempre, apesar da limitação do nosso pecado(Ibidem, p. 3-4).
O Mistério da Misericórdia divina é revelado como ação primeira e essencial de Deus Uno-Trino. O Pai Eterno misericordioso é destacado não como um juiz impiedoso, vingativo e destruidor, mas como um Deus rico em misericórdia, clemente, bondoso, paciente e compassivo. “Misericordiosos como o Pai é, pois, o ‘lema’ do Ano Santo. Na misericórdia, temos a prova de como Deus ama. Ele dá tudo de si mesmo, para sempre, gratuitamente e sem pedir nada em troca”(Ibidem, p.21).
Se o Pai é misericordioso, Jesus “é o rosto da misericórdia do Pai”(Ibidem, p. 3). Pela sua pessoa e sua vida em nosso meio, conhecemos e experimentamos intimamente o amor de Deus.  O mistério da fé encontra em Jesus sua verdade mais profunda e verdadeira. Os ninais que Jesus realiza, “sobretudo, para com os pecadores, as pessoas pobres, marginalizadas, doentes e atribuladas, decorrem sob o signo da misericórdia”(Ibidem, p.11).
Do mesmo modo que o Pai e o Filho, o Espírito Santo comunga de tal compaixão, revelando Jesus Cristo como imagem do Pai e testemunhando a misericórdia do Pai cumprida de uma vez por todas no Filho. O que move a própria dinâmica da redenção humana, dentro e fora dos limites da Igreja, de um modo evangélico renovado, atual e atuante, é o próprio Espírito Santo.
Um momento forte de tal experiência foi no Concílio Vaticano II, quando os “Padres, reunidos no Concílio, tinham sentido forte, como um verdadeiro sopro do Espírito, a exigência de falar de Deus aos homens de seu tempo e de modo mais compreensível”(Ibidem, p. 6).  Assim somos exortados a confiar plenamente em Deus. Que o “Espírito Santo, que conduz os passos dos crentes de forma a cooperarem para a obra de salvação realizada por Cristo, seja guia e apoio do Povo de Deus a fim de o ajudar a contemplar o rosto da misericórdia”(Ibidem, p. 8).
Para reafirma e revitalizar a fé da Igreja sobre a importância da Santíssima Maria nos mistérios divinos, Francisco afirmou que: “Depois do pecado de Adão e Eva, Deus não quis deixar a humanidade sozinha e à mercê do mal. Por isso, pensou e quis Maria santa e imaculada no amor (cf. Ef 1, 4), para que se tornasse a Mãe do Redentor do homem”(Ibidem, p.4). Todavia, pela força do mesmo Espírito de hoje, tal mistério mariano-misericordioso pode ser observado com maior ênfase e importância, na história e tradição da Igreja,  em uma figura de especial importância, a saber, Santo Afonso de Ligório (1696-1787), o fundador dos Missionários Redentoristas.
Para Afonso a Santíssima Maria foi de fundamental importância no seu processo de conversão e no encontro com um Deus louco de amor pela humanidade. O reconhecimento dessa misericordiosa Mãe se expressa na obra Glorias de Maria (LIGORI, 1750)! Esta obra começou a ser feita pouco tempo depois da fundação da Congregação Redentorista, isto é, em meados de 1734, ela durou cerca de 15 anos para ser concluída e está sendo atualizada até hoje.
Na Glórias de Maria a importância e relação da Santíssima Maria com a Misericórdia divina se dá devido a sua amizade com Deus e a própria vontade do Altíssimo, pois “Deus, para glorificar a Mãe do Redentor, determinou e dispôs que, em sua grande caridade, ela intercederia a favor daqueles por quem seu divino Filho satisfez e ofereceu o preço superabundante de seu precioso sangue”( LIGUORI, 1989, p.25). Desse modo é pela vontade de Deus, e não humana ou pessoal, que Maria comunga do projeto da Redenção.
Maria é Rainha de Misericórdia, “cheia de doçura e de clemencia, sempre inclinada a favorecer e fazer bem a nós pobres pecadores”(Ibidem, p.36). Ela é “Rainha de Misericórdia, inclinada só a piedade e ao perdão dos pecadores. Por isso quer a Igreja que expressamente lhe chamemos Rainha de Misericórdia”(Ibidem). Maria é a Mãe de misericórdia. Porém seu título de mãe não é carnal, mas de amor. “Tão somente o amor que nos tem é que a faz ser nossa Mãe. Por isso a Virgem bendiz a si, diz certo autor, de ser Mãe do belo amor, porque é toda caridade para conosco, por ela aceitos como filhos”(Ibidem, p. 53.) seus. “Por ser Mãe de misericórdia, nem recusa nem jamais recusou compadecer-se de nossas misérias, e socorrer os infelizes que imploram o auxílio”(Ibidem, p. 102).
A fé e devoção popular por nossa Mãe de amor é sinal da Misericórdia divina. Isso acontece porque Maria nunca desampara seus devotos. Ora, tal devoção só completa aquilo que é da vontade de Deus: que sejamos salvos. Para os devotos de Maria, a certeza que ela nos assegura é uma solicitude benigna nos momentos mais difíceis e finais da vida terrestre: “[...] é o procedimento de Maria com seus devotos. Nas suas angustias e especialmente nas da morte, que de todas são piores, essa boa Senhora e Mãe não abandona seus fiéis servos”(Ibidem, p.88). Deste modo, resolutamente “Ainda que sejamos pecadores, tenhamos confiança que Maria há de vir assistir-nos na hora da morte, consolando-nos com sua presença, se a servimos com amor durante os dias que ainda nos resta no mundo”(Ibidem, 93).
É da vontade do Filho que sua Mãe, e nossa Mãe misericordiosa, fosse intercessora, advogada para o nosso auxilio, no grande dia da entrada definitiva do Reino. Porém, até mesmo na luta cotidiana ela é utilíssima e fidedigna pelo nosso socorro.
Diz a este propósito o grande padre da Igreja S. Basílio, que o Senhor nos deu Maria como hospital público, onde se pode recolher todos os enfermos, que são pobres e desamparados de todos os socorro. [...] Portanto, quem se achar mais pobre; isto é, mais despido de merecimentos, e mais oprimido das enfermidades [...] pode dizer a Maria: “Senhora, vós sois o refugio dos enfermos pobres; não me desampareis [...]” (Ibidem, p. 107).
Essa experiência da misericórdia mariana, tão atual no Ano Jubilar, possui uma titulação específica para nós Missionários Redentoristas, a saber: A Nossa Senhora do Perpétuo Socorro. Essa expressão ganha força no presente ano jubilar do Ícone da Mãe do Amor que celebramos desde o dia 27 de Julho de 2015 até o dia 27 de julho de 2016. O Ícone do perpétuo Socorro tem como motivação missionária peregrinar pelas unidades Redentoristas do mundo, a fim de revitalizar a fé popular e congregacional na Mãe de Deus e na pessoa de seu Filho. Para nós Redentoristas a ação reparadora e mediática de Nossa Senhora, a Mãe do belo amor, é tão certa que podemos afirmar como nosso fundador:
Esta grande compaixão de Maria [...] a leva a nos socorrer e consolar, mesmo quando não a invocamos. É o que nos mostrou durante sua vida, nas bodas de Caná (Jo 2, 3). [...] Se Maria é tão pronta em ajudar, mesmo sem ser rogada, quanto mais será para consolar quem a invoca e a chama em seu auxílio? (Ibidem, p.117).



[1] Cursou Filosofia na Universidade Estadual do Ceará. Noviço Missionário Redentorista. Possui o seguinte blog: http://isaiasmendes.blogspot.com.br/

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