Isaias Mendes Barbosa
2015 (Semana Universitária)
2015 (Semana Universitária)
A Autobiografia, ou Vita di Vico scritta da se medesimo (1725-1728) de Giamabattista
Vico (1668-1725) apresenta os pontos fortes da sua trajetória contextual,
intelectual e literária, conectados com as ideais germinais que configuram o
projeto viquiano de nuova scienza. Em
tal obra se observa a dimensão que a Filologia contribui para a construção de
um saber integrado ao fazer do arbítrio humano, isto é, um saber que observa o
estudo dos costumes humanos, da cultura, das ciências, das línguas, dos governos
humanos, enfim, uma proposta de uma história ideal eterna e universal das
nações.Tal proposta construtiva viquiana não descuida da relevância de
elementos da tradição retórico-antiga e renascentista,na invenção de nuova scienza, pois considera diversos
saberes da tradição pertencentes aos estudio humanitatis,
como o estudo das Letras, das línguas, das artes e de outras ciências,
fundamentais para a construção de uma nova arte inventiva da vida civil. Nesse
sentido, na dimensão retórica da Autobiografia
também se pode conjetura a sua originalidade e novidade viquiana,quando ele
vincula os elementos esquecidos ou desprezados pela Modernidade: do universo da
tópica e da formação humana, da historicidade humana e daconstrução do mundo
civil na ideia de nuova scienza. A
presente pesquisa considera os seguintes pontos concernes à temática em
questão: i) o aspecto filológico na Autobiografia
de Giambattista Vico, ii) a presença
da herança retórico antiga e renascentista na Autobiografia viquiana e, por fim, iii) a inovação e originalidade
retórico viquiana para um projeto de nuovascienza
da vida civil. O resultado da presente pesquisa evidencia a relevância da Autobiografia de Vico para a compreensão
do significado específico que assume a Filologia e a Retórica no projeto de nuovascienza
de Giambattista Vico, e, a sua contribuição para a construção da vida civil, no
aspecto da prática social, portanto, moral, ético, cultural e político,
fundamental à sociabilidade.
Palavras-chave:
Tradição retórica antiga e renascentista. Filologia. Retórica. Vida Civil. Nova
Ciência.
Introdução
A Autobiografia,
ou Vita di Vico scritta da se medesimo (1725-1728) de Giamabattista Vico
(1668-1725) apresenta os pontos fortes da sua trajetória contextual,
intelectual e literária, conectados com as ideais germinais que configuram o
projeto viquiano de nuova scienza. Em tal obra se observa a dimensão que a
Filologia contribui para a construção de um saber integrado ao fazer do
arbítrio humano, isto é, um saber que observa o estudo dos costumes humanos, da
cultura, das ciências, das línguas, dos governos humanos, enfim, uma proposta
de uma história ideal eterna e universal das nações. Tal proposta construtiva
viquiana não descuida da relevância de elementos da tradição retórico-antiga e
renascentista, na invenção de nuova scienza, pois considera diversos saberes da
tradição pertencentes aos estudiohumanitatis,
como o estudo das Letras, das línguas, das artes e de outras ciências,
fundamentais para a construção de uma nova arte inventiva da vida civil. Nesse
sentido, na dimensão retórica da Autobiografia
também se pode conjetura a sua originalidade e novidade viquiana, quando ele
vincula os elementos esquecidos ou desprezados pela Modernidade: do universo da
tópica e da formação humana, da historicidade humana e da construção do mundo
civil na ideia de nuova scienza. A presente pesquisa considera os seguintes
pontos concernes à temática em questão
i) o aspecto filológico na Autobiografia de
Giambattista Vico, ii) a presença da herança retórico antiga e renascentista na
Autobiografia viquiana e iii)a inovação e originalidade retórico viquiana para
um projeto de nuova scienza da vida civil. O resultado da presente pesquisa
evidencia a relevância da Autobiografia de Vico para a compreensão do
significado específico que assume a Filologia e a Retórica no projeto de nuova
scienza de Giambattista Vico, e, a sua contribuição para a construção da vida
civil, no aspecto da prática social, portanto, moral, ético, cultural e
político, fundamental à sociabilidade.
O
aspecto filológico na Autobiografia
de Giambattista Vico
A Autobiografia,
de Giamabattista Vico (1668-1725) apresenta os pontos fortes da sua trajetória
contextual-literária e o aspecto filológico que tal percurso biográfico
apresenta, na gestação, construção e amadurecimento da orientação filosófica
viquiana e no seu projeto de nuova
scienza. Na cidade de Napoles, a nova
ordem de estudos predominante na época, a saber, a Ratiostudiorum[1] de orientação
matemático-geomético-filosóficaquestionava a validade dos antigos saberes da
tradição clássica, escolástica e renascentista, responsáveis pela formação da
juventude e da sociedade como um todo.
Nessa viragem cultural napolitana Vico se depara
com o predomínio e influência da filosofia de René Descartes a cerca do Método
de Estudo. Para Vico Descarte queria “destacar somente sua filosofia e a
matemática, e lançar por terra todos os outros estudos que completam a divina e
humana erudição”[2]. Deste modo podemos
observar que nesse universo cultural se desconsideravam os diversos saberes
pertencentes aosstudiahumanitatis, como
a História, a oratória e a poesia. Segundo Vicoafirma, Descartes, com base noDiscurso do método (1637):
[...] desaprova os
estudos das línguas, dos oradores, dos historiadores e dos poetas e, dando
importância somente à sua metafísica, à sua física e às suas matemáticas, reduz
a literatura ao saber dos Árabes, os quais tiveram, nesses três ramos, homens
muito doutos, homens como Averrois na metafísica, e tantos famosos astrônomos e
médicos que tem deixado em uma e outra ciência as vozes necessárias para
explicá-las[...].[3]
Esses saberes excluídos pelas correntes
filosóficas de influência descarteana como o racionalismo, o experimentalismo,
o ceticismo, faziam parte da Filologia, uma vez que esta, na perspectiva
viquiana, tinha a função de estudar o discurso, a linguagem e as palavras
conforme o contexto histórico e a cultura de cada época. Tal orientação
considera a etmologia das considera o sentido das palavras que correspondem às
ideias das coisas, a história das coisas, a história das palavras e relação com
a história da construção da natureza humana. Percebe-se então uma nova ordem de
abordagem que considera o aspecto plausível da verdade, o verossímil, ou seja,
o senso comum. Tais observações são apresentadas por Vico no seu itinerário
filosófico e literal. Trata-se, portanto, deuma hermenêutica filológica
presente na autobiografiae
fundamental na orientação viquiana.
Dois pensadores significativos para o
empreendimento filológico viquiano foram Tácito e Francis Bacon. Tácito,
historiador da Antiguidade,“contempla o homem tal como é”[4],
ele “desce a todos os conselhos da utilidade, para que entre os infinitos e
irregulares acontecimentos da malícia e da fortuna se conduza bem o homem com
sua sabedoria prática”[5].
O aspecto da vida prática, ou tudo aquilo que é partedo arbítrio humano
configura os elementos relevantes da abordagem filológica viquiana. Francis,
por sua vez, “homem igualmente de incomparável sabedoria, tanto vulgar como
reflexa”[6]foi
outro pensador que faltava para complementar seu projeto filológico, pois “do
mesmo modo que Platão é um príncipe do saber dos gregos, e os gregos não têm um
Tácito, assim, um Bacon falta, no entanto, aos latinos como as gregos”[7].
Deste modo, Vico “Se admirava que um só homem fosse capaz de ver quanto falta
no mundo das letras”[8].
E a admiração desses
dois grandes autores, desde esse ponto de vista, era para Vico um esboço
daquele plano, sobre o qual ele depois desenvolverá uma história eterna, sobre
a que decorresse a história universal de todos os tempos, tendo lugar nela,
sobre certas eternas propriedades das coisas civis, os nascimentos, estado e
decadência de todas as nações.[9]
No percurso filológico, Vico se deparou
insatisfeito as obras do Senhor de Verulâmioem “que se propôs a descobrir a
sabedoria dos antigos a partir das fábulas dos poetas”[10].
Desta insatisfação o motivou, nas suas últimas obras realizadas, há descobrir “outros
princípios da poesia distinto daqueles que os gregos e os latinos, e os demais
depois, haviam acreditado até agora”[11].
Platão é outro pensador que influenciou Vico, porém foi lendo o Do direito da guerra e da paz (1625)
ele:
descobriu o quarto
autor que devia juntar-se aos outros três que ele havia decidido para si mesmo,
pois Platão bem mais adorna que justifica a sua sabedoria refletida com a
vulgar de Homero; Tácito espalha a sua metafísica, a sua moral e a sua política
entre os feitos, [...]; Bacon vê que todo o saber humano e divino que existia
até então deve se completar com aquele que não tem, e se emendar com aquele que
tem, mas no que concerne às leis, não se elevou com os seus cânones, em
demasia, ao universo das cidades e ao curso de todos os tempo, nem à extensão
de todas as nações. Portanto, Hugo Grocio abarca um sistema de direito
universal toda a filosofia e a filologia, incluída as duas partes desta última,
tanto a história das coisas, já seja fabulosa ou certa, como a história das
três línguas: a hebraica, a grega e a latina, que são as três línguas doutas da
Antiguidade, que têm chegado até nós, pelas mãos da religião cristã. [12]
A abordagem
Filológica viquiana se reporta ao estudo da história humanacoesiva e inventiva
daquilo que pertence ao universo do arbítrio humano, desde as línguas, artes,
ciências, repúblicas, leis, religião e vida social das nações, em cada devida
época. A Filologia contribui para a construção de um
saber integrado ao fazer do arbítrio humano, isto é, há um saber que observa o
estudo dos costumes humanos, da cultura, das línguas, dos governos humanos.A novidade da abordagem filológica
viquianacontribui corresponde a um sistema que articulasse verum/factum, e os seus
princípios fundamentais fossem extraídos das “duas histórias, uma das línguas e
outra das coisas, e da história das coisas, se confirmasse a das línguas de
forma tal que um sistema assim se descrevesse [...] as máximas dos sábios da
academia como as práticas dos sábios da república”[13]. Daí a relevância de ser um
saber da vida prática que postula os princípios fundantes da vida civil do
mundo das nações, desde os seus primórdios.
A
presença da herança retórico antiga e renascentista na Autobiografia viquiana
Se na autobiografia
evidenciamos a relevância da Filologia no projeto viquiano, não podemos
descurar na presente obra de umaherança retórica antiga e renascentista. A
Modernidade trousse consigo o sistema cartesiano que colocou em dúvida e
relegou ao claustro diversos saberes da tradição pertencentes ao humanismo
renascentista[14]. Observamos que neste no
renascimento italiano os estudos e a preocupação filosófica estava voltada para
um retorno dos saberes clássicos-antigos, na pretensão de exaltação da dignitashominus desvinculada de uma
visão teocêntrica. Nessa perspectiva os estudos das letras e das artes liberais humanísticas faziam parte
da nova ordem de saber no renascimento: os studioshumanitis,
ou disciplinas humanistas. Em tais disciplinas a Retórica ganhava sua
relevância para justificação e convencimento de um novo saber ate então
desconsiderado, saberes tais como a literatura, a poesia, os escritos
herméticos, a cabala dentre outros escritos pagãos, e para a persuasão,
eloquência e o bem falar dos doutos da época.
Vico é fruto dessa herança culturalrenascentistano
seu projeto de nuova scienza. Como ele descreve na sua autobiografia, o período de sua infância foi marcado por tais
estudos autônomos quando por várias vezes “se afastou daquela escola, e permanecendo
em casa, aprendeu por si mesmo, o texto de Alvarez, o que ficou por aprender
dos padres na série primeira e nas de humanidades
[...]”[15].
A RatioStudiorum dos jesuítas, que
fazia parte ensino da época possuía alguns desses elementos renascentistas
ligados à religião. Porém é no desenvolvimento do itinerário filosófico
viquiano que ele“começou a compreender que com o sistema de estudos comumente
usado se aprendia bastante menos da metade das disciplinas legais [...].[16]
Estudava-se a lógica crisipea, a metafísica de
Zenão e Escoto, as sumas teológicas e os silogismosaristotélicos dentre outros.
Porém outros saberes ligados a jurisprudência, a boa literatura e erudição,
fundamentais para a vida civil e a formação humana estavam esquecidos.
A
metafísica – que no século XVI havia posto em nível mais sublime da literatura
os filósofos MarsilioFicino, Pico della Mirandola, e ambos Agustinos: tanto
Nifo como Steuchio, GiacopiMazzoni, Alessandro Piccolomini, MatteoAcquaviva,
Francisco Patrizzi, e que havia contribuído tanto para a poesia, a história, a
eloquência, que toda a Grécia, na época em que foi mais douta e mais eloquente,
parecia haver ressuscitado na Itália -, era considerada digna de ser confinada
nos claustros; e de Platão somente se fazia algumas alusões ao uso da poesia,
para fazer ostentações de uma erudição memorística [...].[17]
Percebendo que nos
estudos dos antigos, como Aristóteles, Epícuro e Averroes, que havia estudado
no período escolar em Nápoles, em nada contribuíam para a moral e para uma
metafísica da vida civil, ou seja, para o âmbito da vida prática, decidiu
retomar os estudos, começando pela metafísica de Platão. Valendo-se deste
último, Vico
[...] começou a despertar nele o pensamento de meditar um direito
ideal eterno, que se realizaria em uma cidade universal na ideia ou plano da
providência divina com base em cujas ideias são fundadas todas as repúblicas de
todos os tempos e de todas as nações, que era aquela república ideal que, como
consequência de sua metafísica devia pensar Platão, mas pela ignorância do
primeiro homem decaído não o pôde fazer.[18]
Nesse percurso, ele
também se depara com as questões problemáticas da Modernidade, a saber, o
desprezo pelos saberes da tradição renascentista e da tradição antiga, assim
como a separação entre duas ordens de estudos, a saber, A lógica, com todo o
grupo de ciências físico-matemática; por outro, a retórica, com as denominadas
ciências humanas: a dialética, a eloquência, mas também a jurisprudências, a
política, a moral e a história. A relevância da herança retórico renascentista
se destaca pela preocupação de Vico,na âmbito das letras ou literatura, com os
diversos autores antigos e medievais, com os diversos estilos de argumentação.
Então,[...], se dedicou
a cultiva o falar toscano em seus príncipes: Boccaccio em prosa, Dante e
Petrarca em verso. E, segundo as vicissitudes das jornadas, estudava a Cícero,
ou a Virgílio, ou bem a Horácio, comparando ao primeiro com Boccaccio, ao
segundo com Dante, ao terceiro com Petrarca, com a curiosidade de ver com
integridade de juízo suas diferenças [...].[19]
O interesse de Vico
pelas Letras, pela fundamentação do direito e pela linguagem poética o conduziu
aos estudos dos doutos sapientíssimos pertencentes à tradição antiga e
renascentistas, a saber, Virgílio, Cícero, Petrarca, MarsilioFicino, Pico della
Mirandola, Lorenzo Valla e outros. Esses estudos iriam contribuir para um saber
pré-filosófico fundamental que se reporta ao desenvolvimento das faculdades
humanas, no seu primeiro momento, no qual reina as primeiras operações da mente
humana.
A herança retórica renascentista proporcionou
em Vico uma mente aguda e engenhosa, “já acostumada, pelo muito estudo da metafísica, a vagar com o pensamento
nos infinitos dos gêneros”[20].
Por meio dessa herança é que Vico aprendeu a ler, compreender e argumentar
sobre os diversos pensadores e estilos variados de argumentação,
[...] lendo sempre aos
mais cultos escritores com esta ordem três vezes: a primeira para compreender a
unidade de cada composição; a segunda para ver os começos e o desenvolvimento
das coisas; a terceira, mas em particular, para recorrer as belas formas de conceber
e de expressar-se [...].[21]
Tratar de coisas
distintas, relacioná-las e uni-las pelos laços da eloquência que a fazem
deleitáveis e agudas, a fim de convencer e persuadir, são os elementos que
configuram a marca da Retórica renascentista no projeto viquiano. É por meio de tal habilidade retórica,
construída no progresso dos estudos, que Vico constrói um projeto de nuova
scienza estruturado de tal forma a acordar Filosofia e Filologia, aquilo que é
pertinente aos costumes humanos e aos princípios fundamentais da vida civil.
A
inovação e originalidade retórico viquiana para um projeto de nuova scienza da
vida civil
Se considerarmos a
influência retórica do renascimento italiano, ou melhor dizendo, dos estudos
humanísticos italianos, no projeto viquiano, não podemos considerar Vico como
um simples reprodutor da Retórica até então vigente. Sua proposta é mais
extensa e original do que aquela da tradição renascentista. A primeira proposta
viquiana é considerar os elementos retóricos pertencentes ao pathos contextual de sua época, a saber,
o predomínio da crítica cartesiana, de influência matemático-geométrica na
formação dos jovens.
Porém, com tais lógicas, os jovens levados antes do tempo a crítica,
que é tanto como dizer, levados a jugar bem antes de aprender bem, contra o
curso natural das ideias, que primeiro se deve aprender, depois julgar e
finalmente raciocinar, sucede que a juventude se volte árida e seca ao
expressar-se, e sem haver nunca nada, quer julgar de tudo.[22]
Retomando a tradição
antiga Vico destaca que a tópica é a “arte de encontrar em cada coisa tudo
quanto há nela”[23],
pois assim, “de uma forma natural, os jovens viriam a formar-se como filósofos
e como bem falantes”[24].
Tal propriedade argumentativa e de ensino da antiguidade é uma arte relevante
não só para o bem falar e para o convencimento, mas sua relevância tem um
sentido original e profundo, a saber, a formação das faculdades mentais
pré-reflexivas, como a memória, a fantasia, a imaginação e o engenho.
Observamos que a utilização de tal arte no método de ensino promove a formação
e desenvolvimento da “mente juvenil”[25].
Essas faculdades deveriam ser reguladas pelas artes da tópica, a saber, “a
memória com os estudos da língua, a fantasia com a leitura dos poetas,
historiadores e oradores”[26].
Deste modo a arte tópica está estreitamente relacionada com a construção das
faculdades da mente humana fundamentais com a prática da vida civil. Neste
sentido a Retórica se relaciona estreitamente com os diversos saberes que
englobam o ethos civil.
É desde as orações inalgurais(1699-1707) que Vico
despontaum certo argumento novo e grande que trouxesse um novo descobrimento
para a Itália e para o mundo das letras. Os passos iniciais deste argumento
está noDe nostritemporisstudiorum ratione
(1708), ou seja, De ratione em que Vico fez um paralelo entre o método concernente
aos saberes dos antigos e aquele dos modernos, para observar quais seriam as
“vantagens e inconvenientes dos antigos em todos os ramos do saber, e que
desvantagem teria o nosso [método moderno], e de que forma se poderia evitar, e
aquelas que não se podem, com que vantagens os antigos poderiam compensar”.[27] Tal
obra apresentada por Vico na autobiografia
seria um esboço da obra que mais tarde desenvolveria em sua Sinopse do Direito Universal (1720).
Conforme Vico prossegue nos estudos
das Letras, das artes humanísticas, entre outros saberes vinculados ao âmbito
da cultura, da vida civil, da história e da jurisprudência, vai “demostrando a
verdade das suas próprias posições, mostrando o erro”[28] dos
pensadores da sua época, como Descartes, Spinoza e Locke, mas, igualmente,
Gassendi[29],
assim como indica os problemas do método e de diversas orientações filosóficas
da época.Observamos que a
construção de um saber enciclopédico não seria possível sem a retórica
viquiana.A Retórica viquiana faz uma relação com os diversos saberes da
tradição e da vida civil, como a política, os costumes, a história, a formação
pedagógico humana, a religião, as línguas, os governos, os estados, as leis
fundamentais e primárias da civilidade. Percebemos então que diante deste
diagnóstico se agitava em Vico “[...] certo argumento novo e grande. Que unisse
em um só princípio todo o saber humano e divino [...], que tratasse algum novo
descobrimento e que fosse útil ao mundo das Letras”[30]. Tais observações fez Vico
integrar em um conjunto argumentativo enciclopédico todos os saberes de
dependem do arbítrio humano. Essas luzes fazem parte do projeto viquiano de
nuova scienza.
A proposta original de nova retórica viquiana
faz uma integração com as três extensões fragmentadas ou mau compreendidas da
história da retórica, a saber, o logos,
o ethos e o pathos. O logos se
reporta a comunicação, a força argumentativa do orador, o ethos nos remonta ao caráter ou experiência subjetiva do orador, e
o pathos se qualifica como o
auditório que tem o poder de observar e decidir favorável ou desfavorável sobre
o que está sendo dito. Tal observação se exemplifica numas das orações
inalgurais comentadas por Vico. Pois,
Aqui faz entrar aos
ouvintes uma meditação sobre si mesmo, isto é, que o homem em castigo pelo
pecado está separado do homem pela língua, pela mente e pelo coração. Pela
língua, que frequentemente trai as ideias pelo que o homem quisera e não pode
unir se com o homem. Pela mente, pela variedade de opiniões nascidas da
diversidade de gostos dos sentidos, o que o homem não concorda com o outro
homem. E finalmente pelo coração, que ao estar corrompido, nem sequer a
uniformidade dos vícios concilia o homem com o homem.[31]
Essa pontuação denota a completude da proposta
viquiana nos seus elementos retóricos. Para que se supere a corrupção é
necessário a virtude pelo ethos do
orador, a ciência pelo lógos e a
eloquência pelo pathos humano, pois
somente por estas três coisas[32],
ou seja, somente pelos elementos de fundamentais e constituintes da Retórica, o
homem pode integrar-se no seu processo de humanidade e civilidade. Essas
características perpassam da história de todos os povos e por meio da Retórica
Vico integrou como um todo, Filosofia e Filologia a sua proposta de nuova
scienza na sua mais brilhante obra: a Ciência Nova (1725).
Considerações finais
O resultado da presente pesquisa evidencia a
relevância da Autobiografia de Vico
para a compreensão do significado específico que assume a Filologia e a
Retórica no projeto de nuova scienza de Giambattista Vico, e, a sua
contribuição para a construção da vida civil, no aspecto da prática social,
portanto, moral, ético, cultural e político, fundamental à sociabilidade.
Perceber o projeto viquiano se a Filologia como Ciência é excluir uma dos
aspectos essenciais do pensamento e projeto de Vico, a saber, o aspecto da
praticidade do arbítrio humano. Neste sentido é de fundamental importância
considerar como se deu essa construção nos seus elementos na autobiografia de Vico. Pois esta é
compendio da experiência do autor que trata da ordem dos estudos e do
empreendimento realizado por Vico no seu itinerário de vida. Também não podemos
desconsiderar a relevância que a Retórica apresenta para construção da ciência
nova de Vico, pois apesar de observamos elementos da tradição retórico
renascentista no na autobiografia, é evidente uma superação de tal tradição,
pois a orientação retórica viquiana abrange a própria experiência construtiva
do mundo civil e da natureza humana das nações. Tal empreendimento vai além de
um retomar elementos da tradição antiga ou de um reproduzi aquilo que
configurou o renascimento italiano, nos estudos humanísticos. Daí se justifica
o fato da Ciência Nova de Vico
possuir uma nova arte crítica.
Referências bibliográficas
LIMA PASSOS, José Expedito. A Estética entre saberes antigos e modernos
na Nuova Scienza, de Giambattista Vico. São Paulo: EDUC: FAPESP, 2012.
MEYER, Michel. A retórica [1950].Trad. Marly N. Peres. Editora Ática, São Paulo,
2007.
VICO, G. Autobiografía de Giambattista Vico [1725-1728]. Trad. Esp. Moisés
González García y Josep Martínez Bisbal. Madrird: Siglo XXI de España, 1998.
____. Elementos de retória: El sistema de los estúdios de nuestro tempo y
Principios de oratória [1708]. Edición de Celso Rodrígues Fernandes y
Fernando Romo Feio. Edutorialtrotta. Madrid, 2005.
VERENE,
Donald Phillip. Comentario a lareprension
viquiana de la Metafisica de Descartes, Espinosa y Locke. Um Añadido a
laCiencia Nueva. Sevilla (España), 1995.
[1]Para uma melhor compreensão do significado da
viragem cultural e da Ratiostudiorum napolitana na época de Giambattista Vico,
ver aqui o terceiro capítulo, a saber, Vico
e o novo status cultural napolitano: um diagnóstico do presente no escrito A Estética entre saberes antigos e modernos
na Nuova Scienza, de Giambattista Vico. Cf. LIMA PASSOS, José Expedito. A Estética entre saberes antigos e modernos
naNuova Scienza, de Giambattista Vico.
São Paulo: EDUC: FAPESP, 2012, p.217.
[2] Cf. VICO, Giambattista. Autobiografía de Giambattista Vico
[1725-1728]. Trad. Br. Moisés González García y Josep Martínez Bisbal. Madrid:
Siglo XXI de España, 1998, p.84 (tradução nossa).
[3] Cf. VICO, Giambattista. Autobiografía de Giambattista Vico, p.113.
[4] Ibidem, p.114.
[5] Ibidem.
[6] Ibidem, p.115.
[7] Ibidem.
[8] Ibidem.
[9] Ibidem, p.114.
[10] Ibidem, p.133.
[11] Ibidem.
[12] Ibidem, p.134.
[14] Ibidem, p.106.
[15]Ibidem,p.83.
[22] Ibidem, p.97.
[23] Ibidem, p.97.
[24] Ibidem, p.98.
[25] Ibidem, p.97.
[26] Ibidem.
[27] Ibidem, p.124.
[28] Cf. VERENE, Donald Phillip. Comentario a lareprension viquiana de la
Metafisica de Descartes, Espinosa y Locke. Um Añadido a laCiencia Nueva.
Sevilla (España), 1995, p.156. (Cuadernos sobre Vico 5/6, 1995-96)
[29] Cf. Ibidem, pp. 165-183.
[31]Ibidem, p. 121-122.
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