Isaias Mendes Barbosa[1]
04/10/2013. (XII Semana de Filosofia-UECE)
RESUMO
O
presente artigo trata do conceito de alienação na perspectiva de Karl Marx (1818
-1883). Para Marx, o processo de autorealização do homem só se efetiva na sua
relação com a natureza (objeto de produção) pelo trabalho (atividade de objetivação
do objeto e produção). Para que o trabalho promova a realização do homem é
preciso, porém, que seja livre e não explorado. A formação econônico-social
capitalista promove a exploração, a divisão e diferença entre as classes,
separando, igualmente, o trabalhador do seu objeto de produção e de si mesmo.
Neste sentido ocorre o que Marx identifica como alienação. Tendo como base a obra Manuscritos econômico-filosóficos, de1844, e outros textos
complementares, a fim de se aprofundar essa temática,pretende-se aqui abordar
os seguintes questões: i) o conceito de Trabalho: relação homem x natureza; ii)
a alienação do homem no produto de seu trabalho; iii) a alienação no processo
de produção no interior da própria atividade produtiva; iv) o homem alienado de
seu ente-espécie; e v) a alienação do homem pelo outro. Esses pontos aqui
indicados se reportam ao modo de ser do homem para a Economia clássica e para a
sociedade moderna, ou seja, como uma mercadoria.
Neste sentido, o homem está sujeito àcondição de exploração, escravidão,
coisificação, em suma, alienação no seu processo de trabalho ena sua autorealizaçãocompreendida
como emancipação de seu gênero.
Palavras-chave:
Homem, Trabalho, Alienação.
Introdução
Os
Manuscritos econômicos- filosóficos(1844),
conhecidos também como Manuscritos de
Paris, representam uma das expressões fundamentais do pensamento marxiano[2]. Nele
Marx abordar os primeiros momentos de sua crítica à economia política clássica,
na qual Adam Smith eRicardosão seus maiores representantes[3], e
ao idealismo hegeliano, contrapondo este com as ideias materialistas
Feuerbachiana. Tal obra apresenta as contradições do sistema econômico político
burguêsde sua época, ou seja, o sistema capitalista, que parte de pressupostos,
não fundamentados nem explicados como a propriedade privada, o seu processo
material e suas leis, a distinção entre trabalho e capital, capital e terra.
Desse modo, ele abordatambém as consequências caóticas desse sistema que tanto
mantem a propriedade privada, a divisão de classes, como promove o trabalho
explorado ea alienação do homem.
A
marca de destaque de abordagem dos manuscritos
é a concepção deestranhamento, sejade
sua atividade produtiva, de sua relação com a natureza e de sua espécie, ou
seja, do seu sergenérico. Isso ocorre,
nesse sentido, quando o homem, no trabalho enas suas relações sociais de
produção, está subordinado ao sistema capitalista, queretira dele o fruto de
sua produção, o conhecimento e domínio da natureza na sua produção, e,
consequentemente,o aliena a si mesmo. A alienaçãono trabalho acontece de tal
modo que tanto na relação do homem com a natureza, do homem com seu trabalho e com
sua espécie há uma dependência e estranhamento e ao mesmo tempo, a negação da
própria natureza humana, pois o que move o seu agir não é mais sua autonomia,
sua vontade autodeterminante e subjetiva, o seu caráter humano de criar-se e
produzir-se conforme sua liberdade e potencialidade, mas as leis que regem o
sistema em função da produção de capital.Desse modo, Marx identifica que o
trabalhodentro do sistema capitalista[4]condiciona
o homem a alienação, no seu grau mais elevado, e oobjetifica diante da máquina
e o torna uma ferramenta, ou seja, uma mercadoria. Abortando, assim, o seu
processo de emancipação humana, de continuidade genérica de seu ser.
O
presente artigo busca a apresentar algumas considerações,na formação econômica
social capitalista, que condicionam a alienação
do homem em suas quatro formas relacionais. O homem, pelo trabalhonão-alienado
constrói a si mesmo, seu gênero. Essa é a base fundamental do desenvolvimento e
da produção e evolução humana quando corretamente efetuada. Dessa forma no
trabalho o homem se autoproduz ese autorealiza, enquanto gênero humano, e
produz, pela relação de produção, os componentes fundamentais de sua essência.
Essencialmente a finalidade da produção é fazer o homem chegar a sua essência,
que está nele se autopromover e se autoproduzirpelo trabalho. Dessa forma ele está
num processo natural e inacabado de evolução. O trabalho livre produz a sua
dignificação enquanto único ser universal e produtor de seu mundo, de sua
realidade e de si. Porém,para Marx, seguindo ométodo critico-dialético de base
hegeliana, o trabalho tem um momento de negação da natureza humana, que écategorizado
historicamente, e de modo mais forte, no sistema econômico capitalista. Assim,
esse sistema é expressão dessa negação, e contradição das condições de evolução
do gênero humano, pois ai o trabalho é perverso para com o operário. E converte
o trabalho livre em trabalho forçado, alienando o operário.
Neste
sentido a alienação será o momento de negação ou distanciamento, ou estranhamento da essência do homem, do seu ser
genérico no sistema econômico capitalista. A alienação se faz na natureza como
objeto de produção, que limita o homem a sua dependência e servidão no sistema
de produção. Este sistema explorador condiciona o homem a um alienar-se, pois
ele não se realiza no trabalho, mas está fadado a trabalhar em função de sua
subsistência, na alienação de seu gênero, o humano, condicionada por alguém que
o determina e nega a promoção de sua essência: o outro.
Conceito de Trabalho: relação homem
x natureza
O trabalho na história da filosofia
pode ser compreendido de diversos modos conforme seu contexto específico. Para
os Gregos o trabalho era uma atividade produzida pelo escravo e este estava,
pela sua natureza, determinado para trabalhar, já que a capacidade intelectiva
não era propriedade própria de sua natureza. Com isso a discrepância entre os
homens que tinham o ócio para pensar (Cidadãos) e o outros, ou seja, os
escravos, ou estrangeiros, que estavam determinados a trabalhar, era algo que
fazia parte da Natureza de cada indivíduo e de sua capacidade, além das leis
impostas nas relações econômicas e sociais da Polís. No período medieval o
trabalho é visto como um bem comum, porém nem todos trabalham da mesma forma. O
diferencial é que o homemque outrora era escravo, ou seja,vassalo, tinha sua
dignidade resgatada em suas atividades no campo, e liberdade para efetuar um
trabalho próprio após o serviço prestado os senhor feudal. Todavia, o trabalho se perpetuava como
atividade dos servos. Desse modo, o servo poderia trabalhar de modo mais livre
e confortável de tal modo que sua produção não ferisse sua integridade humana,
mas o dignificasse enquanto servo e livre. Na modernidade o trabalho atinge uma
concepção distinta, tanto a classe dominante e dona da propriedade de terras
como os comerciantes, como a classe trabalhadora que era a força de trabalho, se
exercia em vista do lucro e do crescimento economicamente. Neste sentido, entra,
porém,a concepção de trabalho em Karl Marx que é conceituada nesse contexto de
revolução[5]e
sua definição está relacionada com os fatores determinantes desse período e com
sua filosofia rópria vinculada a pensadores da economia clássica, Ingleses,
alemães e etc.É importante ressaltar que para Marx o trabalho é produção social
e veículo de autorealização do homem, ou seja, expressão da vida[6]Desse
modo o trabalho é a base do desenvolvimento humano, de suas relações de
produção e humanização.
No primeiro livro do O
CapitalMarx descreve o conceito de trabalho nesses termos:
Antes de tudo, o trabalho é um processo entre o
homem e a Natureza, um processo em que o homem, por sua própria ação, media,
regular e controla seu metabolismo com a Natureza. Ele mesmo se defronta com a
matéria natural como uma força natural. Ele põe em movimento as forças naturais
pertencentes à sua corporalidade, braços e pernas, cabeça e mão, a fim de
apropriar-se da matéria natural numa forma útil para a própria vida.( MARX,
1983, p.149)
Daí o trabalho surge na relação do
homem com a natureza. Sem ela o homem não produz aquilo que lhe é próprio:
trabalho e seu gênero.Pois ela contém o material necessário para que o homem
produza. O homem a domina e atua com sua capacidade e potencialidade. O
trabalho é algo natural do homem, porém pode se questionar: os demais animais
não trabalham?! Pode-se dizer que os animais fazem operações semelhantes ao
homem, porém o diferencial é que enquanto os animais estão determinados por sua
natureza a fazer determinada coisa, o homem, por sua vez, possui a imaginação,
a inteligência, a reflexão, o pensamento, e produz tudo isso, a partir de sua
mente,no seu trabalho. A sua produção não é mero efeito natural e necessário
como funções animalescas, mas é produção para um determinado fim útil[7]. A
atuação sobre a natureza modifica-a e ao mesmo tempo a própria natureza do
homem é transformada. Neste sentido, o que o homem produz é algo de si que ele
externa, isso o modifica e o valoriza. Marx Escreve sobre o processo de
trabalho dizendo:
No processo de trabalho a
atividade do homem efetua, portanto, mediante o meio de trabalho, uma
transformação do objeto de trabalho, pretendida desde o princípio. O processo
extingue-se no produto. Seu produto é um valor de uso; uma matéria natural
adaptada às necessidades humanas mediante transformação da forma. O trabalho se
uniu com seu objetivo. O trabalho está objetivado e o objeto trabalhado. (MARX,
1983, p. 151)
Como se vê o homem exerce sua
atividade sobre a matéria a ser trabalhada. Essa matéria é objeto de trabalho e
sofre a transformação pelo sujeito que a modifica. O resultado é o produtoque tem um valor de uso, e um valor de trabalho efetuado. Porém, o resultado
também é o fim ou a objetivação que é efetuada pelo homem e em função do homem.
No processo de conclusão do trabalho, a matéria final produzida é a objetivação
do trabalhador e o objeto trabalhado em seu momento final. Nesse processo
têm-se duas relações interessantes: o trabalhador modifica o objeto material,
de casualidade dada para causalidade posta, e ao mesmo tempo ele se modifica,
pois o resultado da produção garante um reconhecimento de si na obra que ele
produziu e uma externalidade daquilo que não era objetivado, mas subjetivo, no
momento anterior. Neste sentido o produto obtido revela quem o criou, ou seja,
quem trabalhou a matéria. E no processo de produção o trabalhador externou uma
parte sua que era até então desconhecida, ou seja, o que ele produziu revelou
uma extensão de si que até então não se efetivava, a não se depois desse
momento de produção. Por isso se diz que na efetivação do trabalho tanto o
objeto, ou matéria prima, é modificada pelo sujeito, como ele mesmo se
modifica. Dessa forma acontece a relação intrínseca de produção, identidade,
reconhecimento, e evolução, entre o trabalhador e seu trabalho.
Na obra Manuscritos econômicos e filosóficos, Karl Marx irá fazer uma
crítica à economia política dosistema
econômico nacional, ou seja, ao sistema capitalista da burguesia,
determinante das leis que regem o processo econômico das relações de produção
em questão. Nela Marx expõe as contradições que o sistema irá produzir em si e
as mudanças que sofrerá o homem tanto no processo de trabalho como na sua consciência,
exteriorização de si, do seu gênero, pelo trabalho. As consequências dessa
Economia Política será a alienação[8]e a
perversão do trabalho no seu âmbito profissional e do homem.
A
alienação do homem no produto de seu trabalho
Com a economia política o
trabalhador ficou fadado a um sistema econômico que o afunda até um nível de
mercadoria, como Marx afirma nos manuscritos econômicos:
A existência do trabalhador é,
portanto, reduzida à condição deexistência de qualquer outra mercadoria. O
trabalhador tornou-se uma mercadoria e é uma sorte apara ele conseguir chegar
ao homem que se interesse por ele. E a procura, da qual a vida do trabalhador
depende, depende do capricho do rico e capitalista. (MARX, 2008, p.30)
A concepção sobre a economia políticaestá
pelo o que ele mesmo impõe no seu sistema administrativo. Pelas suas leis que
regulam e condicionam o trabalho humano e as relações sociais de produção. Ela
está pautada sobre a divisão humana em
duas classes: a do proletariado e a do capitalista, sendo que a primeira
está submissa à segunda. Daí, para melhor compreendermos o conceito de
trabalhador Karl Marx afirma:
É evidente que por si mesmo que a
economia nacional considere apenas como trabalhador o proletariado, isto é,
aquele que, sem capital e renda de terra, vive puramente do trabalho, e de um
trabalho unilateral, abstrato. Ela pode, por isso, estabelecer a proposição de
que ele, tal como o cavalo, tem de receber o suficiente para poder trabalhar. (MARX,
2008, p.30)
Esse entendimento conceitua o
processo de escravidão e dependência a que está fadado o trabalhador. Dai,
enquanto antes ele era livre para se exercer e produzir o fruto do seu
trabalho, enquanto ele tinha todo o entendimento sobre o modo de produção, as
relações de troca e a sua significação e reconhecimento no trabalho realizado,
o sistema econômico capitalista, que orienta as articulações e a dinâmica das indústrias,
ou dos modos de produção e lucro, de capital e juros, impõe ao homem- não
proprietário-um modo específico de trabalho, uma forma de produção limitada, uma
dependência com o trabalho para sua sobrevivência e um distanciamento do seu
objeto de trabalho:a causalidade dada. Isso ocorre porque as condições de
produção não estão em função de sua necessidade e nem de sua valoração e
dignificação, mas do próprio capital.
A economia capitalista apresenta
como base do seu sistema as categorias próprias do regime burguês como
realidade supra-históricas, eternas, que não devem ser objeto de transformação
estrutural. Sua analise parte sobre pressupostos que não tocam a realidade
históricas e a vida social. Ela renuncia renuncia a qualquer pretensão
defornecer as bases para a compreensão do conjunto da vida social, deixando de
lado o procedimento analítico da produção e sua implicações na vida oscial.Daí
a economia do sistema capitalista parte da seguinte pressuposição apresentada
por Marx:
Partimos dos pressupostos da
economia nacional. Aceitamos sua linguagem e suas leis. Supusemos a propriedade
privada, a separação de trabalho, capital e terra, igualmente do salário, lucro
de capital e renda da terra,da mesma forma que a divisão do trabalho, a
concorrência, o conceito de valor de troca etc. A partir da própria economia
nacional, com sua palavras, constatamos que o trabalhador baixa a condição de
mercadoria à de mais miserável
mercadoria, que a miséria do trabalhador põe-se em relação inversa à potência
(Machta) à grandeza (Grösse) da sua
produção, que o resultado necessário da concorrência é a acumulação de capital
em poucas mãos,( MARX, 2008, p.79)
Esses pressupostos fazem parte do
sistema econômicos político. Ele aborda todos esses elementos que são suas leis
de reger a economia e as relações de produção sociais como a propriedade
privada, a separação do trabalho, capital e terra, o lucro e a concorrência,
dentre outras coisas. Porém ele não explica a conexão que existe entre essas
relações e o que produz essas divisões. Com isso, segundo Marx, a única coisa
que ela movimento é a ganância e a guerra
entre os gananciosos e a concorrência.Desse modo Marx faz um leitura e
explicação dadas premissas assumidas pela economia política da seguinte
maneira:
Nós partimos de um fato
nacional-econômico, presente. O trabalho se torna tanto mais pobre quanto mais
riqueza produz, quanto mais a sua produção aumenta em poder e extensão. O
trabalhador se torna uma mercadoria tão mais barata quanto mais mercadoria
cria. Com a valorização do mundo das coisas aumenta em proporção direta a
desvalorização do mundo dos homens[9]
Com isso é notório a relação inversa
que se tem entre ele (o trabalhador) e aquilo que ele produz. O trabalhador
produz o objeto, este objeto fez-se coisa. Essa é a objetivação do trabalho,
que é sua efetivação. Essa efetivação, no estado nacional econômico, produziu a
desefetivação do trabalhador e sua perda ao objeto e sua servidão ao mesmo,
pois quanto mais o trabalhador produz, mais ele se torna dependente do que produziu
e mais ele desconhece aquilo que era seu objeto de trabalho, daí surge a
alienação[10]. Nesse sentido Marx afirma:
Quanto mais o trabalhador se
desgasta trabalhando, tanto mais poderoso se torna o mundo objetivo, alheio que
ele cria diante de si, tanto mais pobre se torna ele mesmo, seu mundo interior,
[e] tanto menos [o trabalhador] pertence a si próprio. [...] A exterioridade do
trabalhador em seu produto tem significação não somente de seu trabalho se
torna um objeto, uma existência externa, mas, bem além disso, [que se torna uma
existência] que existe fora dele, independente dele e estranha a ele,
tornando-se uma potência autônoma diante dele, que a vida que ele concebeu ao
objeto se lhe defronta hostil e estranha.[11]
Portanto, no sistema econômico, as
relações se invertem e o objeto de trabalho que parecia próximo e de
reconhecimento e elevação da dignidade do trabalhador se torna, assim,
distante, superior e ele, exterior, alheio, exterior. Pois, quanto mais o
trabalhador produz, menos tem para consumir; quanto mais valor cria, mais
sem-valor e indigno ele fica.
A
alienação no processo de produção, dentro da atividade produtiva
Como
vimos, a economia política apresenta a divisão de classe: a do capitalista e a
do proletariado. A primeira submete a segunda sob seu domínio e dependência. A
segunda faz parte dos proprietários de terra, enquanto que a outra faz parte
dos não-proprietários. O trabalhador é
manipulado as condições determinantes de sua produção e a sua subsistência vai
estar determinante pela necessidade de produzir. Sua produção é exterior a ele,
pois ele tanto não possui o domínio geral sobre seu objeto, ou produto, como não
produz para si, mas para outro. Na medida em que ele produz mais e mais, sua
identidade com o produzido e seu reconhecimento se distanciará cada vez mais
dele, pois tanto o objeto valerá mais do que ele como ele estará em estado de
servidão de seu produto. Portanto, a inversão dos valores entre trabalhador e
produto acontece.
O segundo momento dessa alienação se
faz no processo de produção desse produto, pois se o próprio produto é
alienação o processo de efetivação desse produto terá a mesma instância. Daí a
alienação no processo de produção inicia-se no aspecto da própria natureza do
trabalhador, ou seja:
O trabalho é externo ao
trabalhador, isto é, não pertence ao seu ser, que ele não se afirma, portanto,
em seu trabalho, mas nega-se nele, que não se sente bem, mas infeliz, que não
desenvolve nenhuma energia física e espiritual livre, mas mortifica sua physis
e arruína o seu espírito.[12]
A obrigação é o fator determinante
de sua disposição para o trabalho, a falta de liberdade é uma da marca característica
de uma não exteriorização de si. Nesse sentido o trabalho não é realização e
satisfação do sujeito e muito menos um ato de produção que acrescente
significado a sua identidade, mas na verdade é uma separação do ‘eu’genérico,
que de certo modo representa toda a humanidade, com o que se produz, com a
objetivação efetivada.Nesse sentido, quando se está trabalhando, não é o ‘eu’
que está trabalhando, pois não existe uma relação de independência, liberdade e
autonomia do sujeito no ato da produção e no seu processo de atividade
produtiva, mas algo que não tem nada haver com o seu ser, com aquilo que é
fundamental e contribuinte para a natureza humana. A alienação nesse sentido é
inevitável. Daí a efetivação do trabalho não é um fim que promova a humanização
do sujeito, mas um meio para se saciar outras necessidades, que não a dele.
Sendo assim, o trabalho é mortificação e sacrifício do trabalhador e sua
realização está na posse de um outro, como afirma Marx: ‘Finalmente a
externalidade do trabalho aparece para o trabalhador como se [o trabalho] não
fosse seu próprio, mas de um outro, como se [o trabalho] não lhe pertencesse,
como se ele no trabalho não pertencesse a si mesmo, mas a um outro.’(Cf. MARX,
2008, p. 83)
A
alienação no homem de sua ente-espécie
Assim, o trabalho, na perspectiva
político-econômica, aliena o homem do seu objeto de produção, ou seja, do seu
produto, da natureza como objeto de produção, o distanciando do mesmo a tal
ponto de quanto mais ele produzi-lo, menos valer, maisempobrecer de si, mais
distanciar-se do seu produto, e mais dependente dele (do produto) será. Se o trabalhador está alienado do seu produto,
isso se dá pelo modo, ou sistema de produção que também é alienante. E nesse
sentido a identidade do trabalhador se perde, ou seja, o trabalhador aliena a
si mesmo, pois trabalhar, para ele, não será identificar-se com o que faz, não
é produção de si, mas é distanciamento e separação da própria atividade com o
que pertence a ele mesmo. Isso implica em um fazer para outro, contra ele
mesmo, pois este se mortifica, se anula, se auto-aliena na produção de algo que
não é dele, não tem haver com ele e não é para ele, mas para outro.
Essa duas implicações leva em
consideração outra consequência no trabalho para o trabalhador: o alienar-se de
sua espécie. Assim, como o trabalho o aliena nos dois pontos, ele também o
aliena de sua espécie, de seu gênero.
O homem é um ser genérico tanto
quando pratica ou faz do gênero, das coisas, o seu objeto, quanto se relaciona
consigo mesmo, como com o gênero vivo de sua espécie. O homem se distancia dos
animais pelo seu ser universal. A sua relação com a natureza é de extensão de seu
espírito, pois ele utiliza dela de modo a produzir sua essência e estender sua
consciência. Assim como as plantas, os animais e tudo mais formam teoricamente
uma parte da consciência humana, tanto como objeto da ciência natural, como da
arte, que ele prepara para fruição de si, a natureza inorgânica, os meios de
vida espiritual, também formam uma parte da vida humana e da atividade
humana. A natureza, desse modo é o corpo inorgânico do homem, pois nela ele
precisa estar em movimento de relação para não morrer. Dessa forma o homem,
diferente dos demais animais, é um ser consciente, livre e universal, que se
auto produz na medida em que se relaciona com a natureza, com o eu trabalho. Na
medida em que ele se relaciona com a natureza e se conecta a ela, ele tanto
mantem a sua espécie, como produz aquilo que é do seu gênero humano. No sistema
econômico a alienação ocorre também no aspecto do gênero do homem. Marx
sintetiza o nosso caminho percorrido da alienação na seguinte citação:
Na medida em que o trabalho
estranho 1) estranha do homem a natureza, 2) [e o homem] de si mesmo, de sua
própria função ativa, de sua atividade vital; ela estranha do homem o gênero
[humano]. Faz-lhe da vida genérica apenas um meio da vida individual. (MARX,
2008, p.84).
Dessa forma o homem se aliena da
objetivação de sua produção, de sua relação com a natureza, de si mesmo, quando
não mais se identifica com o que produz e muito menos com sua espécie. A
alienação da sua espécie implica que ele diferente do que é próprio de seu
gênero está determinado pelo trabalho a produzir algo estranho a ele, que
contem um valor superior que ele, a se separar de sua natureza essencial no ato
de produção, a distanciar-se de seu mundo produzido na realidade pelo trabalho,
aproduzir somente para sua subsistência assim como os animais e demais seres, a
distanciar-se de seu próprio gênero, de seu ente-espécie.
Daí algumas implicações se
reproduzem no fato da alienação, pelo trabalho, do homem ao seu gênero como:
O trabalho estranhado faz, por
conseguinte: 3) do ser genérico do homem, tanto da natureza quanto da faculdade
genérica espiritual dele, um ser estranho a ele, um meio da sua existência
individual. Estranha do homem o seu próprio corpo, assim como a natureza fora
dele, tal como a sua essência espiritual, a sua essência humana. 4) uma
consequência imediata disto, de o homem estar estranhado do produto do seu
trabalho, de sua atividade vital e de seu ser genérico é o estranhamento do
homem pelo [próprio] homem. Quando o homem está frente a si mesmo, defronta-se
com ele o outro homem. (MARX, 2008, p. 85-86)
A
alienação do homem pelo outro
Se
o homem está fadado a alienação tanto do produto, da natureza, como de si, como
do seu gênero, a quem pertence então todo esse trabalho? A resposta é simples,
Erich fromm parafraseia a resposta de Marx nesses termos:
O ser estranho a quem pertence o
trabalho e o produto deste, a quem o trabalho é devotado, e para cuja fruição
se destina o produto do trabalho, só pode ser o próprio homem. Se o produto do
trabalho não pertence ao trabalhador, mas o enfrenta como uma força estranha,
isso só pode acontecer porque pertence a um outro homem que não o
trabalhador.(FROMM, 1983, p. 98)
Se o homem está determinado pelo
trabalho a alienar-se, a ser servo de sua produção, a se automortificar, a
estranhar aquilo que ele produz, e a sua própria atividade, a se exercer
simplesmente pela sua subsistência, por um prazer que não se realiza no
trabalho, mas fora dele, por uma negação de sua espécie, isso só pode acontecer
pelo seu semelhante que o determina. Ou seja, é o próprio ato do homem contra o
trabalhador, do proprietário que subjuga o não-proprietário, que produz a
alienação do homem.
Consideraçõesfinais
Portanto,
conforme apresentado, o homem na história segue um processo dialético de
gerar-se negar-se e superar-se. Existência e essênciafazem parte dele, e seu
movimento na história será de um autosuperar-se. Essa visão é hegeliana, porém
Marx a materializa na história e nas relações sociais e econômicas do homem. A
priori a relação homem e natureza seguia uma dialética pelo trabalho livre em
que o homem se autorealizava na sua produção, porém coma divisão do trabalho e
com a privatização de terras o homem está fadado a limitar-se na produção e aautorealização
pelo trabalho. Daí existe os primeiros momentos dessa alienação que culmina no
sistema econômico político capitalista.
Este é momento em que a alienação
chega no seu ápice, pois o trabalho será forçado, e o valor da natureza, do
gênero, da dignificação do homem, de sua produção, declinará conforme a
intensificação de seu trabalho. Dessa forma a alienação entra como um
distanciamento da essência do homem e de seus meios de produção. A princípio
quanto mais ele produz, mais perderão seu valor e mais dependerá do objeto de
sua produção, por conseguinte, na efetivação do trabalho ele se autodesconhecerá,
pois o trabalho não é realização sua, e nem identificação com sua essência, mas
sofrimento e meio de existência, com isso, seu gênero será distanciado de si,
uma vez que ele não é mais o que deveria ser sua espécie. Por último, a causa
de tudo isso será o outro que o determina pela divisão de classes e pelo
domínico dos menos favorecidos. Esse processo de alienação, segundo Marx só
será superado com o comunismo, ou seja, quando a classe do proletariado se
libertar das amarras da alienação. Porém, seguindo o método dialético marxiano,
essa sociedade não marca o fim da história, mas o ponto inicial de uma nova
história que apresentará as suas contradições e tendências que possibilite sua
superação por outro momento a ser construído e constituído pela emancipação
humana.
Referências
bibliográficas
ARAÚJO,
Carlos Roberto Vieira. História do pensamento econômico: uma abordagem
introdutória. São Paulo: Atlas, 1988.
COSTA,
FREDERICO JORGE FERREIRA; PORTELA, JOSANIA LIMA; ARAÚJO, RAQUEL DIAS. Concepção
Marxiana de Trabalho e os Desafios da Atualidade.; Cadernos da Pós-Graduação da
FACED/UFC; 1999; 1; 10; ; 49; 56; Português; 14140829; Outro; ; Título do
Periódico: Correntes Modernas da Filosofia da Ciência.
FROMM,
Erich. Conceito Marxista do Homem. Zahar editores. 8ª ed. Rio de
janeiro, 1983.
MARX,
Karl. Manuscritos Econôminos- Filosóficos.[ Trad. Jesus Ranieri].
Boitempo editorial. São Paulo, 2008.
MARX,
Karl. O capital: crítica da economia política. São Paulo: Abril
Cultural, 1983.
NETTO,
José Paulo. Economia política: uma introdução crítica/José Paulo Netto, Marcelo
raz.-7.ed.-São Paulo: Cortez, 2011.
[1]
Aluno do curso de filosofia/licenciatura da Universidade Estadual do Ceará.
[2]Referente á Karl Marx.
[3] Segundo José Paulo Netto na Economia política: uma introdução crítica
(2011, p.27), os maiores representantes da Economia Política clássica são Adam
Smith e David Ricardo. Suas duas características centrais da teoria da economia
clássica são que: a Economia política interessava compreender o conjunto das
relações sociais no período da crise do antigo regime e sua compreensão sobre a
economia política entendiam suas categorias e instituições naturais não se
modificavam.
[4] Cf. Erich Fromm
na obra Conceito Marxista do Homem, 1983, p55. Escreve: “Como indiquei antes,
Marx admitiu que a alienação do trabalho, apesar de existir através de toda
história, atinge o auge na sociedade capitalista, e que a classe trabalhadora é
a mais alienada de todas”.(FROMM, 1983, p. 46)
[5]Revolução Industrial na França.
[6] Erich Fromm cita o pensamento da
Marx nos seguintes termos: ‘Toda a concepção de Marx a respeito da
auto-realização do homem só pode ser plenamente compreendida em ligação com sua
concepção do trabalho. [...] o trabalho, por outro lado, é, ou devia ser
enquanto livre, a expressão da vida. ’(FROMM, 1983, p. 46)
[7] Jorge Ferreira, Josania Lima e
Raquel Dias, afirma na Concepção Marxiana
de Trabalho e os Desafios da Atualidade (1999, p.31 et seq.)que a essência
do trabalho é dada pela articulação entre teleologia e causalidade, que por sua
vez, se efetua no reflexo.
[8]O conceito de alienação se
reproduz melhor na ideia de afastamento, distanciamento, ou estranhamento do
sujeito com aquilo que ele produz ou consigo mesmo.
[10]Erich Fromm define sobre a
alienação nesses termos: ‘A alienação (ou ‘alheiamente’) significa, para Marx,
que o homem não se vivencia como agente ativo de seu controle sobre o mundo,
mas que o mundo 9ª natureza, os outros, e ele mesmo) permanece alheio ou
estranho a ele.[...] Alienar-se é, em última análise, vivenciar o mundo e a si
mesmo passivamente, receptivamente, como o sujeito separado do objeto.’ (FROMM,
1983, p.50)
[12](MARX,
2008, p. 82.)
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